Nota de editor:
Devido à
existência de erros tipográficos neste texto,
foram tomadas várias decisões quanto à
versão final. Em caso de dúvida, a grafia foi
mantida de acordo com o original. No final deste livro
encontrará a lista de erros corrigidos.
Rita
Farinha (Mar. 2009)
MINISTÉRIO DO INTERIOR
direcçãogeral
de instrucção secundária,
superior e especial
1.ª REPARTIÇÃO
BASES
PARA A
UNIFICAÇÃO DA ORTOGRAFIA
QUE DEVE SER ADOPTADA NAS
ESCOLAS E PUBLICAÇÕES OFICIAIS
RELATÓRIO DA COMISSÃO
NOMEADA POR
PORTARIA DE 15 DE FEVEREIRO DE 1911
NOVAMENTE REVISTO PELO RELATOR
LISBOA
IMPRENSA NACIONAL
1911
MINISTÉRIO DO INTERIOR
direcção
geral de instrucção secundária,
superior e especial
1.ª REPARTIÇÃO
BASES
PARA A
UNIFICAÇÃO DA ORTOGRAFIA
QUE DEVE SER ADOPTADA NAS
ESCOLAS E PUBLICAÇÕES OFICIAIS
RELATÓRIO DA COMISSÃO
NOMEADA POR
PORTARIA DE 15 DE FEVEREIRO DE 1911
NOVAMENTE REVISTO PELO RELATOR
PREÇO
50 RÉIS
LISBOA
IMPRENSA NACIONAL
1911
Imprensa Nacional de Lisboa―Gabinete da Revisão.―Ex.
mo
Sr.―Julgo do meu dever chamar a atenção de V.
Ex.
a para o que passo a expor.
As publicações saídas da Imprensa
Nacional, quer oficiais, quer de particulares, apresentam grafias
diferentes, umas discutíveis, outras porêm
grosseiras e
vergonhosas. O próprio
Diário do
Govêrno, que deveria ter ortografia uniforme,
emprega diversas, conforme o capricho de quem envia os originais,
geralmente pessoas indoutas.
Tais variedades de grafias trazem para a Imprensa não
só descrédito mas tambêm
prejuízos pecuniários, porquanto a
composição de todos os diplomas
saídos no
Diário tem de transitar para outras
publicações
periódicas, tais como
Boletins,
Ordens,
Separatas, etc., sofrendo
então cada um dêsses diplomas mais emendas, ao
sabor de quem tem de lhes fazer nova revisão.
Tantas emendas, alêm de estabelecerem confusão no
espirito do compositor, avolumam de uma maneira assombrosa a despesa da
composição, e impedem a rapidez na
impressão pelo muito tempo que se perde a fazer
alterações.
Com esta anarquia ortográfica os compositores hesitam e
cometem novos erros, e aos revisores se torna tambêm
impossível fixar, para cada obra, as divergências
de tanta grafia.
Urge, portanto, acabar com êste estado de cousas.
Fácil me parece o remédio. Se cada qual se tem
julgado
até aqui com direito a impor a sua maneira de escrever,
porque razão o Govêrno da República
não ha de impor tambêm a sua, e no que
é seu?
Sujeite, pois, o Govêrno a uma única ortografia
todas as publicações oficiais ou por
êle
subsidiadas.
[4]
E qual deverá ser essa ortografia?
Em meu entender deverá adoptar-se a que no seu livro
A Ortografia Nacional
preconiza a
maior autoridade no assunto, o doutíssimo
filólogo
Gonçalves Viana. Essa obra tem o aplauso de todos os que
modernamente se tem dedicado ao estudo profundo da sciência
da linguagem; e a ortografia simplificada defendida naquele livro
é
já seguida por grande número de professores e
escritores de valor, e adoptada em muitos livros escolares, revistas,
etc.
Desnecessário se torna, pois, encarecer as vantagens da
adopção de um único sistema
ortográfico a quem, como V. Ex.
a, de
sobejo as conhece e
aprecia. Pelo lado
económico tem a Imprensa muito a ganhar. Tampouco
é para desprezar o louvor que a V. Ex.
a
caberá
por contribuir, com a adopção da ortografia
simplificada, para a
maior facilidade no ensino da leitura da nossa bela língua.
Expondo, embora imperfeitamente, a minha opinião
acêrca do que julgo ser melhoramento de um dos
serviços da Imprensa, confio em que V. Ex.
a
se
dignará tomar na devida consideração o
alvitre que neste oficio ouso
apresentar a V. Ex.
a.
Lisboa, 17 do Dezembro de 1910.―Ex.
mo Sr.
Luís Carlos
Guedes Derouet, Digníssimo Administrador Geral da Imprensa
Nacional.―
José
António Dias Coelho, chefe do serviço
da revisão.
Imprensa Nacional de Lisboa―Administração
Geral―n.º 238.―Tenho a honra de levar ao conhecimento de V.
Ex.
a o oficio que recebi do chefe do
serviço da
revisão, relativamente à necessidade de se
adoptar uma ortografia uniforme nos trabalhos desta Imprensa e
principalmente no
Diário ao
Govêrno.
Estou perfeitamente de acôrdo com as
considerações que faz o aludido
funcionário, pois que não pode nem
deve continuar a anarquia que presentemente existe. Embora o problema
ortográfico não se resolva por
completo de momento, pelo menos que nos trabalhos oficiais se mantenha
a uniformidade.
Chamo para o facto a devida atenção de V. Ex.
a,
certo de que o assunto lhe merecerá toda a solicitude.
Saúde e Fraternidade.
Lisboa, 14 de Janeiro de 1911.―Ex.
mo Sr.
Director Geral da
Instrução Secundária,
Superior e Especial.―O Administrador Geral,
Luís
Derouet.
[5]
Ministério do Interior―Direcção Geral
da Instrução Secundária, Superior e
Especial.―1.ª
Repartição.―O Govêrno
Provisório da República Portuguesa, atendendo ao
que lhe foi representado pelo Administrador Geral da Imprensa Nacional,
no sentido de serem tomadas providências tendentes a
uniformizar a ortografia oficial, por forma a evitar que nas
publicações emanadas daquele
estabelecimento do Estado continuem a adoptar-se, paralelamente, as
mais desencontradas formas ortográficas;
Conformando-se com o parecer da secção permanente
do Conselho Superior de Instrução
Pública:
Manda, pelo Ministro do Interior, que seja nomeada uma
comissão, composta de D. Carolina Michaëlis de
Vasconcelos, Aniceto dos Reis Gonçalves Víana,
António
Cândido de Figueiredo, Francisco Adolfo Coelho e
José Leite de Vasconcelos, encarregada de fixar as bases da
ortografia que deve ser adoptada nas escolas e nos documentos e
publicações oficiais, e bem assim de organizar
uma lista ou vocabulário das palavras que possam oferecer
qualquer dificuldade quanto à maneira como devem ser
escritas.
Paços do Govêrno da República, em 15 de
Fevereiro de 1911.―O Ministro do Interior,
António
José de Almeida.
(Diário do
Govêrno n.º 39, de 17 de
Fevereiro de 1911).
Ministério do Interior―Direcção Geral
da Instrução Secundária, Superior e
Especial―1.ª
Repartição.―Manda o Govêrno
Provisório da República
Portuguesa, pelo Ministro do Interior, que à
comissão encarregada de
uniformizar a ortografia oficial, nomeada por portaria de 15 de
Fevereiro último, sejam agregados os seguintes vogais: Dr.
António José Gonçalves
Guimarães, Dr. António Garcia Ribeiro de
Vasconcelos, Augusto Epifânio da Silva Dias, Júlio
Moreira, José Joaquim Nunes e Manuel Borges
Grainha.
Paços do Govêrno da República, em 16 de
Março de 1911.―O Ministro do Interior,
António
José de Almeida.
(Diário do
Govêrno n.º 64, do 20 de Março
de 1911).
Mistério do Interior―Direcção Geral
da Instrução Secundária, Superior e
Especial―1.ª
Repartição.―Conformando-se com o parecer da
comissão encarregada, por portaria de 15 de Fevereiro de
1911, de estabelecer as bases
[6]
para a unificação da ortografia que deve ser
adoptada nas escolas e nos documentos e
publicações oficiais:
Manda o Govêrno da República Portuguesa, pelo
Ministro do Interior:
1.º Que o relatório da referida comissão
seja
publicado no
Diário do
Govêrno, devendo ser para o futuro adoptada em
todas as escolas, e bem assim nos documentos e
publicações oficiais, a ortografia proposta pela
comissão;
2.º Que se dê a tolerância
máxima de
três anos, a contar da data da
publicação da presente portaria, para
a conservação das grafias existentes nos livros
didácticos actualmente em uso, a fim de não
prejudicar os respectivos autores ou editores;
3.º Que se promova a rápida
organização e publicação,
pelo preço mais módico possível, de um
vocabulário ortográfico e de uma cartilha,
especialmente destinada a vulgarizar e exemplificar o sistema de
ortografia adoptado;
4.º Que a comissão nomeada por portaria de 15 de
Fevereiro
de 1911 continue em exercício pelo tempo que se julgar
conveniente, a fim de ser ouvida sobre quaisquer dúvidas que
se suscitem relativamente à
execução da reforma proposta, podendo a referida
comissão
reùnir-se por iniciativa própria, ou convocada
pela
Direcção Geral da Instrução
Secundária, Superior e
Especial, por intermédio da qual serão feitas
quaisquer
reclamações sôbre o assunto.
Paços do Govêrno da República, em 1 de
Setembro de 1911.―O Ministro do Interior,
António
José de Almeida.
(Diário do
Govêrno n.º 206, de 4 de Setembro de
1911).
Ex.mo Sr. Ministro do Interior:
A Comissão, nomeada por portaria de 15 de Fevereiro do
corrente ano para fixar as bases da ortografia que deve ser adoptada
nas escolas e nos documentos oficiais e outras
publicações feitas por conta do Estado,
vem hoje apresentar a V. Ex.
a os resultados do
estudo a que procedeu,
bem como as decisões que, por grande maioria ou por
unanimidade de votos dos indivíduos que a
compõem, entendeu ser oportuno propor, tomando por elementos
principais dessas decisões a história da
língua portuguesa, e a da sua escrita tradicional
até época muito
recente.
Logo na sessão inaugural, celebrada em 15 de
Março último, julgou a Comissão que
seria vantajoso
para a absoluta independência e imparcialidade das suas
resoluções, como corpo consultivo, propor a
agregação de mais
alguns conhecidos filólogos portugueses; e essa
conveniência reconheceu-a V. Ex.
a
nomeando, por portaria de
16 do referido mês, alêm dos indivíduos
já
anteriormente nomeados, mais seis; ficando a Comissão
composta de onze pessoas, uma das quais, porêm, o Professor
Augusto
Epifânio da Silva Dias, se escusou, declinando o encargo.
Ficou assim a Comissão constituída por dez
membros, e, em razão de ser par êste
número, teve o
presidente eleito por ela de resolver com voto de desempate algumas
questões de secundária importância, em
que divergiram as
opiniões, expressas depois de discussão por
votações diferentes, equivalentes em
número.
Quatro dos membros da Comissão, isto é, a Sr.
a
D. Carolina
[8]
Michaëlis de Vasconcelos, que a Comissão
elegeu Presidente honorária, os Drs. António
José Gonçalves Guimarães e
António Garcia Ribeiro de
Vasconcelos, e o Professor Júlio Moreira, não
puderam comparecer
às sessões semanais, em razão de
residirem longe de Lisboa, localidade em que a Comissão se
reuniu: foram
porêm sempre consultados em todas as questões em
que
não houve unanimidade de votos por parte dos
indivíduos presentes; havendo sido os votos dêsses
ausentes tomados em
consideração, e dando-se-lhes oportuno
conhecimento das
resoluções adoptadas pelos membros presentes
às sessões, que não foram mais
amiudadas, porque outras
funções oficiais dos membros da
Comissão o não permitiram, e assim
se explica a relativa morosidade dos seus trabalhos.
Logo nas duas primeiras sessões foi unânime o
parecer de, seguindo-se uma tendência já
manifestada no
espírito público, se simplificarem as grafias
correntes, entre si contraditórias, regularizando-as em
obediência ao
princípio capital de simplificação.
Por proposta,
unânimemente aprovada, do Presidente adoptou-se para base da
discussão o Questionário ortográfico
em tempos apresentado
por um dos seus membros à Academia das Sciências
de
Lisboa, e pela mesma Academia mandado imprimir na sua tipografia, em
1902, com as respostas do autor dêsse
Questionário, em um volume de 183 páginas, cujo
título é
As
Ortografias
Portuguesas. Esta obra foi ao depois reeditada pelo
referido autor em outro volume, acrescentada e com maior
cópia de abonações e
diferente economia de texto, volume que é do conhecimento do
público
e se intitula
Ortografia Nacional.
Teve
a Comissão igualmente em atenção o
Vocabulário
Ortográfico e
Ortoépico da Língua Portuguesa,
ainda do mesmo
autor, impresso em Lisboa no ano passado, e no qual o sistema
ortográfico dêsse autor se encontra larga e
minuciosamente exemplificado. Pode êle, com efeito, ser desde
já
utilizado, emquanto outro se não publique, em que as
pequenas
alterações, que sofreram os princípios
em que se baseou, sejam incluídas e atendidas de
preferência na
seqùência alfabética dos
vocábulos.
Poucas e de pequena importância relativa foram as
modificações que a Comissão entendeu
conveniente que se fizessem no sistema ortográfico ali
proposto e seguido, e essas foram adoptadas para que êle
ficasse mais em harmonia com modos de escrever que, conquanto menos
conseqùentes, se tornaram já, a bem dizer,
habituais; e tais
[9]
modificações em preceitos, que o autor daquelas
obras defendera com razões históricas cuja valia
a
Comissão reconheceu, tiveram por causa o considerar a
Comissão que alguns dêles eram em demasia
prematuros, e um ou outro já extemporâneo, em
virtude de usos
ortográficos radicados e que se não devem
considerar absolutamente como erros scientíficos.
Teve pois a Comissão em atenção que a
estranheza, que poderiam ocasionar no público certas
innovações ou renovações
gráficas, não viesse prejudicar a
aceitação dos demais preceitos, que
parecerão a todos exeqùiveis.
O autor, membro da Comissão, concordou com todas essas
modificações, e votou com a maioria da
Comissão em todas elas. À primeira
espécie pertencem a
manutenção do
h inicial, de
ge,
gi, mediais de vocábulos,
em concorrência com
je,
ji, e todos os valores actuais dados
à letra
x, que o mesmo autor reduzira
a dois
únicos, o inicial, como em
xadrez, e o
do prefixo
ex- valendo por
eis ou
is, como em
expor,
exército, etc. Os
preceitos da segunda espécie, que, se bem que perfeitamente
motivados nas propostas do autor do Questionário, a
Comissão julgou
já de há muito fora do uso comum, são
principalmente o
emprêgo de
ç inicial, e o do
z final, com o valor actual de
s, em sílaba átona, que
sobretudo figura na
última sílaba de muitos nomes
patronímicos, como
Gonçálvez,
Núnez, que presentemente se escrevem
Gonçalves,
Nunes, com
-es, em oposição
à sua etimologia, a
desinência latina
ici, de genetivo.
Esses nomes e vocábulos, como
ourives,
simples,
mesquinho,
continuarão
pois a escrever-se com
s final de
sílaba, na ortografia comum.
Entendeu tambêm a Comissão que seria inoportuno
suprimir o
s inicial do grupo
sce,
sci, que figura
etimológicamente em algumas palavras, tais como
sciência,
scetro,
scéptico,
scelerado,
scena,
scisão,
scisma e seus derivados e afins, principalmente,
com relação ao primeiro
dêstes vocábulos, porque no sul de Portugal se
profere
êsse
s separado do
c,
em formas compostas,
como
presciência,
consciência,
insciência,
cônscio, etc. Comparem-se
tambêm
en(s)cenação,
e
proscénio, com
s proferido êste
último.
¿Quais são as bases da ortografia portuguesa que
a Comissão propõe?
Havia, logo desde o início dos trabalhos, dois sistemas a
que se atendesse, um dêles a ortografia francesa, que, mais
ou menos coerentemente se tem há certo tempo imitado em
Portugal; o outro, as ortografias espanhola e italiana,
[10]
muito mais simples, racionais, lógicas e
fáceis de aprender, muito mais conformes com a
evolução
natural e mesmo literária dêsses idiomas, em
muitos pontos
análoga à do português. O que
radicalmente
diferença a ortografia dêsses dois idiomas
oficiais, e bem assim as de outros congéneres entre si, com
êles e com o
nosso, falados quer em Espanha, quer em Itália, é
a
modificação da ortografia latina dos
inúmeros vocábulos gregos
romanizados, para outras mais conformes com o valor das letras de tais
vocábulos nessas línguas modernas.
Facilitando o ensino da leitura e da escrita, a Comissão
julgou que já era tempo de se desterrarem por uma vez da
escrita portuguesa, como há muito o estão
da espanhola e da italiana, para não mencionar as de outros
idiomas mais desviados do latim, os símbolos
ph,
th,
rh, e
y, por
f,
t,
r,
i, e o
ch com o valor de
k, o qual ficará substituído
por
qu antes
de
e,
i, e por
c em qualquer outra
situação, como se fêz em castelhano.
Com esta simplificação muito ganhará a
língua escrita e o seu
aprendizado e exercício, pois mais se aproximará
da realidade
dos factos constantes da sua pronúncia, que aqueles
estranhos símbolos disfarçam, e ao mesmo passo se
acercará das ortografias espanhola e italiana, consideradas
universalmente, e por todos os filólogos, como das mais
perfeitas entre as que adoptaram o abecedário romano, e o
apropriaram às conveniências nacionais. Com
efeito, pode afoutamente dizer-se que a ortografia francesa e as
actuais portuguesas que a imitam são escrita de eruditos e
para eruditos, ou que presumem sê-lo; as ortografias italiana
e espanhola são escrita para todos os indivíduos
que nessas nações sabem ler e escrever. Deseja a
Comissão que em Portugal aconteça outro tanto, e
nesse intuito se
inspirou.
Outra simplificação igualmente importante, que a
Comissão sugere como absolutamente necessária,
consiste na abolição de consoantes dobradas, as
quais
ficam reduzidas, como em castelhano, a simples, com
excepção de
rr,
ss,
mm,
nn mediais, quando acusem
diferença de pronunciação, o que se
dá, por exemplo, nos vocábulos
cassa,
carro,
emmalar,
ennovelar, comparados a
casa,
caro,
emanar,
enervar.
Estas duas simplificações, sós por si,
acabam definitivamente com dois dos maiores tropeços com que
se encontra estorvada a escrita nacional, e que já poucos
defensores conscienciosos, conscientes e autorizados
lograrão
[11]
obter. Todos, ou quási todos os que
lêem ou escrevem, aplaudirão de certo estas
simplificações há tanto tempo
desejadas e sugeridas.
Alêm da inutilidade prática, e mesmo
teórica, que oferece actualmente a
duplicação de consoantes na
escrita, como
cc,
dd,
ff,
gg,
ll,
mm,
nn,
pp,
tt, outro estôrvo
apresentam ainda as nossas escritas, relativamente modernas, e consiste
êste no emprêgo de
c ou
p antes de
t, formando os grupos
ct,
pt, e ainda
pç,
cç, como em
producto,
restricto,
corrupto,
escripto,
assumpção,
funcção, etc.,
nos quais tanto o
c como o
p são de todo
inúteis para a pronunciação. A
Comissão preceitua que essas letras escusadas
desapareçam da escrita portuguesa, onde vieram enxertar-se
por influência estranha. Casos, porêm,
há, e muitíssimos, em que tais consoantes ou
são ainda facultativamente proferidas, ou a sua
influência subsiste no valor das vogais
a,
e,
o que as precedem, as quais, em vez
de se obscurecerem, como é de regra, nas sílabas
antetónicas, conservam os seus valores, relativamente
à,
è,
ò, que tinham quando essas consoantes,
hoje mudas, se proferiam. Dêste modo, a Comissão
entendeu ser de necessidade
a conservação delas, quer quando a vogal,
a,
e ou
o precedente
é
átona, quer em vocábulos aparentados, quando
é tónica; por exemplo:
direcção,
directo,
acção,
activo,
acto,
tracção,
tracto,
excepção,
exceptuar,
excepto,
adopção,
adoptar,
adopto, comparados estes
últimos vocábulos com
opção,
optar,
opto, em que o
p se profere. Com esta
excepção aos princípios
simplificadores que a Comissão observou no sistema
ortográfico que propõe,
conseguiu não demudar o aspecto de centenas de palavras
relativamente modernas, mas de uso constante; e com tanto maior
razão o fêz, quanto é certo que
em muitas destas palavras as letras
c e
p por muitas pessoas são
ainda proferidas, tais como
facção,
recepção,
espectador, a par de
espe(c)taculo,
etc. Quanto ao
g que precede
m ou
n, ou ainda outras letras, entendeu a
Comissão dever
eliminá-lo nas palavras em que se não profere,
como
assinar,
Inácio,
aumentar,
Madalena, comparadas com
designar,
Agnelo,
fragmento, o que
já
há quatro séculos Duarte Nunes do Lião
aconselhara; só modernamente êle
aí foi introduzido, quando se implantaram artificialmente
entre nós ortografias servil e inconseqùentemente
etimológicas,
quási todas por influência da escrita francesa.
Outro tanto acontece com
damno,
solemne, que se
escreverão, como dantes,
dano,
solene.
[12]
Efectivamente, se na leitura de livros estrangeiros houvesse
predominado em Portugal a de italianos ou espanhóis, nunca
tais complicações ortográficas
se haveriam enraizado na escrita literária do idioma
pátrio,
avêsso a tais arrebiques, e ao qual é de toda a
conveniência restituir a simplicidade e coerência
da antiga escrita.
Outra feição essencial numa ortografia, que seja,
quanto possível, imagem dos fenómenos que se
observam na
linguagem falada, é a regularização da
sua
acentuação gráfica, por meio da qual
se diferencem palavras que se escrevam com as mesmas letras, mas tenham
pronunciação e significação
diversas; e ainda que seja por tal
modo combinada e aplicada, que nenhuma dúvida possa
subsistir com relação a qual seja a
sílaba
predominante de qualquer palavra ou forma, em idiomas em que, como
acontece em português, a acentuação
tónica pode afectar uma qualquer das três
sílabas finais. Nesta
condição é muitíssimo
superior à italiana usual a ortografia castelhana, que
assinala sistemáticamente com o acento agudo (´)
todos os
vocábulos esdrúxulos e todos os terminados em
consoante, se a sílaba predominante é a
penúltima, ou terminados em vogal, se ela é a
última. A
Comissão atendeu a essa condição
essencial da leitura, e suposto a
não preceitue já como obrigatória em
todos os casos em que
seria necessária, aconselha-a e fixa-lhe as regras que a
determinarão, quando rigorosamente empregada, como
convirá que o seja em todos os livros de ensino e consulta.
Sabe a Comissão que esta parte da reforma
ortográfica será aquela que maiores dificuldades
encontrará
na sua execução, principalmente a
acentuação distintiva de tantíssimos
homógrafos, como os que existem em português,
muitos mais do que em castelhano, ou mesmo em italiano. Essas
distinções obrigarão quem
escreve para o público a ser um tanto mais cauteloso na
ortografia das palavras, do que usualmente o é na
actualidade. Em
compensação, porêm, o escritor
já não terá futilidades
etimológicas a respeitar por costume, e o bom ensino da
leitura em breve habituará as gerações
novas
à acentuação rigorosa.
Não foi condescendência com a inércia
que imperou no ânimo da Comissão, ao deixar em
certo modo
facultativo, por emquanto, o uso pontual da
acentuação
gráfica em todas as suas minúcias, como o
é o da castelhana,
e com a mais estrita coerência; mas sim o reconhecimento de
que as condições naturais do idioma
português exigem que essa acentuação
gráfica seja muito
mais copiosa e diferencial
[13]
do que o é a castelhana, em si modelar na sua
simplicidade. Na realidade, em castelhano não há
a
diferençar
e,
o fechados de
e,
o abertos, o que dispensa o uso do acento
circunflexo nesse idioma, no qual não existe o
considerável número de homógrafos que
se observa em português; e alêm disto
não se
dão em castelhano os constantes acidentes de
variação de valor em
e,
o, que no português se produzem e
determinam um sem número de
vocábulos entre si diferentes fonéticamente,
conquanto nas letras com que se escrevem sejam iguais, e que nenhum
ouvido português confundirá, como é
conveniente que a escrita os não confunda, tais como
entêrro,
almôço,
substantivos, e
entérro,
almóço,
verbos;
sôbre,
preposição e
sóbre, verbo;
sêde
e
séde;
pêlo substantivo
pélo, verbo, a par de
pelo
(
p'lu)
contracção de
per
lo, preposição e artigo;
pâra,
preposição, e
pára, verbo;
dêmos, presente, e
démos,
pretérito, etc.
Nestes homógrafos, porêm, para se evitar
acentuação dispensável, o que cumpre
é assinalar-se no
e e no
o o seu valor de
ê,
ô, visto que os nomes
destas letras em português se proferem com vogais abertas,
è,
ò, devendo pois
considerar-se êsse valor como o seu normal quando
são
tónicas. Por êste motivo, o que convêm
em tais
homógrafos é marcar-se com o acento circunflexo
as vogais fechadas, omitindo-se o acento agudo em
e
e
o abertos, e escrevendo-se portanto as palavras
citadas, e outras análogas,
sôbre e
sobre,
almôço
e
almoço,
entêrro e
enterro,
sêde e
sede,
pêlo,
pélo e
pelo,
pára e
para,
dêmos e
demos. E necessário que
pélo,
pára,
pólo sejam
porêm marcados com o acento agudo, pois as
contracções
pelo,
polo (arcaica esta) e a
preposição
para
são sempre
átonas. A forma da 1.ª pessoa do plural do
pretérito perfeito dos verbos em
-ar, como
louvámos, receberá, o que
é já uso corrente, o
acento agudo, para se diferençar da do presente,
louvamos, por isso que o
a antes de consoante nasal, é
normalmente fechado, isto
é, proferido
â, e a
distinção se observa em quási todo o
domínio português.
Algumas considerações consagrará ainda
a Comissão ao sistema de acentuação
gráfica.
Como é já uso estabelecido, o acento agudo
(´)
é o sinal, por excelência, da sílaba
predominante de todo o
vocábulo que não seja átono, com
excepção de
e,
o fechados, que serão, aceitando-se o
costume que em português
se foi lentamente fixando, assinalados com o acento circunflexo (^).
Fixa a Comissão o uso, mais ou menos vagamente
[14]
seguido, de marcar com outro acento disponível, o grave (`),
as vogais
a,
e,
o, abertas, de sílabas
pretónicas, quando haja homógrafos a
diferençar entre si. Nesta
conformidade escrever-se hão:
à,
contracção de
a artigo e
a preposição, de que se
diferençará;
àquela, diferente de
aquela;
prègar, diverso de
pregar;
mòlhada, e
molhada, particípio
femenino de
molhar. Preceitua pois a
Comissão que o acento grave indique o valor
alfabético das vogais
a,
e,
i,
o,
u (
à,
è,
ì,
ò,
ù), e dêste
preceito se deduzem todas as aplicações que
dá ao acento grave. Essas outras
aplicações são as seguintes:
1.ª Distinguir homógrafos,
aquela,
àquela,
pregar,
prègar, quando a vogal distintiva seja
átona; 2.ª, marcar as vogaes
a,
e,
o, abertas, em palavras que tenham
dois acentos tónicos, o último dos quais seja o
predominante, como é de regra em português,
chapèuzinho,
avòzinha,
màzona;
3.ª, dissolver
ditongos átonos,
saìmento,
paìsagem,
saùdar,
a par de
saída,
país,
saúde, em que
i,
u são tónicos; 4.ª,
diferençar o
u proferido, dos grupos
qu,
gu, do
u mudo dos mesmos
grupos,
freqùente, comparado a
quente,
argùir, comparado a
seguir. Quando o
u passe a ser tónico, o acento grave
mudar-se há em agudo;
ex.:
argúi, diferente de
argùi.
Como a Comissão fixou que a subjuntiva fraca dos ditongos
seja sempre escrita com
i,
u e nunca
e,
o é inútil o
emprêgo de qualquer sinal diacrítico nestas duas
letras, para denotar que não formam ditongo com a vogal
precedente, como em
moeda,
neófito,
cooperar, etc.
A escrita dos ditongos orais será portanto a seguinte, na
qual
éi,
éu,
ói, com a vogal dominante
aberta, se diferençam de
ei,
eu,
oi, em que ela é fechada:
ai
(
ài,
âi),
éi,
ei,
ói,
oi,
ui,
au,
éu,
eu,
ou,
iu, do que são exemplos estes
vocábulos:
pai,
caiar,
réis,
reis,
sóis,
sois (verbo),
fui,
pau,
céu,
seu,
riu,
levou. Preferíu-se
acentuar as vogais abertas de
éi,
éu,
ói, visto serem elas
sempre tónicas; êsse acento mudar-se há
no grave, quando
acidentalmente elas sejam em certo modo átonas, como em
vèuzinho,
painèizinhos,
heròicidade.
Os dois
valores da escrita
ai
(
ài e
âi) como em
ensaio,
ensaiar, é
desnecessário acusá-los, por isso que o ditongo
âi
átono só se manifesta antes de vogal, pois quando
tónico se escreve
ei.
No Formulário de regras de ortografia, que a
Comissão submete à
apreciação do
Govêrno, ficarão consignados os principais
preceitos da acentuação escrita, que
se encontram postos em prática no
Vocabulário
Ortográfico, a
[15]
que já se referiu, e completamente expostos de
páginas 155 a 200 da
Ortografia
Nacional,
tambêm já citada, a qual tem um
copiosíssimo índice
alfabético e remissivo, que facilita a sua consulta nos
casos duvidosos. Exemplos rigorosos dêste sistema de
acentuação
oferece-os igualmente todo êste relatório, bem
como de toda a ortografia
que se propõe.
Aludiu agora mesmo a Comissão à
distinção, que é mester deixar
retratada na escrita, entre
e
e
o fechados e
e e
o abertos, quando entre
si
distinguem inúmeras palavras e formas gramaticais. Outra
não menor dificuldade oferece a língua
portuguesa, comparada às suas
congéneres: é a atonia de certas vogais, que
adquirem timbres especiais,
e lhe é peculiar, só tendo paralelo na
catalã, e em muito menor grau, e de certo modo, na francesa
e na provençal moderna, mas em qualquer delas sujeita a
menor número de excepções. Neste ponto
é o português só comparável,
ainda que vagamente, ao inglês. Com
efeito, ao
a tónico, geralmente
proferido
à, corresponde
um
a átono, quási sempre
surdo,
â; ao
ò ou
ô tónicos, um
o que se profere como
u na
grande
maioria dos casos; ao
è ou
ê,
um
e surdo átono, mais ou
menos perceptível na pronúncia, conforme os sons
com que está em
contacto e lhe influem no timbre. Se êsse
e átono é
seguido de vogal, ou é inicial de vocábulo, vale
por
i, ex.:
veado,
evitar; se se lhe segue consoante palatal,
ch,
x,
j,
s,
lh,
nh, equivale a
i surdo, e
com
êste se confunde no falar usual e desafectado. Comparem-se,
com efeito, entre si vocábulos tais como
ferro,
ferreiro;
grêlo,
grelar;
fecho,
fechar;
cereja,
cerejeira;
telha,
telhado;
desenho,
desenhar;
pesca,
pescar, e
pisco,
piscar;
esteira e
história;
testar e
distar;
distinto, de
distinguir; e
destinto de
destingir; atente-se igualmente na
pronúncia do vocábulo
privilegiado que é
preveligiado,
muitas vezes erróneamente assim escrito, e ver-se
há quanto é
difícil a nossa escrita.
Por outra parte, e o último vocábulo o comprova,
numa seqùência de sílabas, todas as
quais
tenham
i por vogal antes da predominante,
êsse
i escrito, quando átono,
profere-se quási sempre como
e
surdo, em pronúncia desafectada. Há
excepções que as
gramáticas devem explicar.
Desta série de fenómenos, que tornam o
português o mais delicado e interessante dos idiomas
neo-latinos, originam-se constantes erros e
hesitações na sua escrita, a que não
é possível obviar, a
não ser por uma transcrição
absolutamente fonética, a qual reproduza fielmente todos
[16]
êsses acidentes, e que seria inadmissível em
ortografia corrente e usual, pois sómente um ouvido
exercitado e um tirocínio especial a poderiam aplicar.
Não se pense, portanto, que a fixação
de uma ortografia regularizada e simplificada possa remover todas as
dificuldades, sem um suficiente preparo gramatical, em que a
derivação e formação das
palavras, e os resultantes acidentes na variação
dos sons que as compõem,
conforme a sua situação, hajam sido estudados.
A consulta oportuna de um vocabulário, como o já
indicado, feito em harmonia com os preceitos estabelecidos,
será tambêm indispensável,
não só em razão do emprêgo
de
o ou
u e tambêm
e ou
i átonos, quer antes de
consoante, quer antes de vogal, mas ainda com
relação ao uso de
ç
ou
ss mediais, de
ce,
ci,
s(s)e,
s(s)i,
z ou
s entre vogais, e quando finais, e em menor escala
o de
ch e
x, de
ge,
gi ou
je,
ji.
O
Vocabulário
Ortográfico indicado remove todas as
dúvidas, visto encontrar-se nele a etimologia dos
vocábulos, quando necessária a essas
distinções
ortográficas, a comparação vocabular e
formal com a ortografia
denominada etimológica, e a conjugação
dos
verbos, exemplificada em todas as suas diferentes modalidades.
É um livro que se pode considerar adequado ao
período de
transição, que há-de decorrer antes
que se vulgarize a ortografia regularizada oficial.
A Comissão não hesitou, respeitando a
história do idioma pátrio, as suas origens e a
sua
evolução no tempo e no espaço, em
conservar a distinção
gráfica entre
ç e
s(s), entre
z e
s mediais, pôsto que
nenhuma diferença se observe já na sua
pronúncia do Mondego para o
sul, e a distinção se vá obliterando
cada
vez mais nos centros urbanos das províncias do norte.
A diferenciação gráfica, conforme a
sua origem, entre
se,
si, e
ce,
ci, iniciais, entre
ç e
ss mediais, bem como a que ainda dialectalmente
subsiste entre
z e
s intervocálicos, ou
x
e
ch ou
ô e
ou, pertencem à
história da língua, e a Comissão
conserva-as, regulando-as com o maior rigor; pois ficaria em
contradição com essa
história se, o que fôra relativamente
fácil, optasse por escrever
sempre
z entre vogais, e sempre
s em finais de vocábulos;
porque não seria licito, nem ninguêm lhe
aceitaria,
substituir
ce,
ci,
ç, por
s ou
ss, em milhares de
vocábulos e formas, que sempre se tem conservado diferentes
na sua escrita, e com bons fundamentos.
[17]
Neste pressuposto, prescreve que
ce,
ci,
ç, ou
z final de vocábulos correspondam a
ci,
ti latinos, a
ss arábicos; e
s,
ss a
s ou
ss latinos; e, por outra parte, que
z corresponda a
z, ou
ce ou
ci,
ti latinos, ou a
zz arábicos;
s entre vogais, ou final, a
s
latino. Nos
vocábulos de origem americana indígena
ce,
ci,
ç são
preferíveis a
s,
seguindo-se nisso a escrita tradicional. Para quem não
esteja preparado com umas noções, rudimentares
que
sejam, de latim, a consulta ao
Vocabulário
é indispensável em casos duvidosos, e muitas
vezes é conveniente a
comparação com as correspondentes formas ou
palavras castelhanas, pois no idioma do centro de Espanha a
confusão entre
s e
c ou
ç (modernamente escrito
z) é
impossível, pois bem se diferençam na
pronúncia, como antes acontecia
em Portugal e no resto da Península Hispánica.
Muito menor dificuldade apresenta a diferenciação
entre
ch e
x, e o
Vocabulário,
bem como a
escrita castelhana, em que
x é
modernamente
representado por
j,
fácilmente a indicam. Bastará aqui dizer-se que,
em geral,
ch corresponde a
cl,
fl,
pl latinos, e que em
vocábulos de origem arábica o
emprêgo de
x é de regra. Com
respeito à selecção entre
ô
e
ou, deve considerar-se que o digrama
ou corresponde a
au ou
al latinos, às vezes a
oc,
ap, e ao
au arábico: a diferença
é intuìtiva para
todos os portugueses do norte e das duas Beìras, pois
ou
para êles é ditongo, e não
simplesmente
o
fechado, como o é no sul do país.
A escrita dos ditongos nasais será, como é
já uso radicado,
ãe,
õe,
em,
ens,
ão como em
mãe(s),
botões,
bem,
bens,
mão(s); e, conforme
tambêm há muito se usa, nas
terminações átonas dos verbos o
ditongo
ão
será escrito
am; assim teremos, por
exemplo,
louvam,
louvaram, presente e pretérito,
louvarão, futuro, sem
precisarmos de indicar por acentos a diferença. Nos
substantivos,
porêm, o acento na sílaba predominante
diferenciará
cóvão de
covão, designando o acento a atonia do
ditongo final, como em
órfão,
órgão,
Estêvão, etc.,
visto que a escrita
orfams seria uma novidade
inútil, e
órfans daria causa a
equívoco, conquanto o respectivo femenino se escreva
órfã(s). O ditongo
em,
quando predominante em
polissílabos, receberá o acento circunflexo, como
em
armazêm,
armazêns,
porêm, a par de
margem,
porem, cuja escrita
indicará a acentuação
márgem,
pôrem, mesmo sem ser
marcada. O ditongo
ũi de um
único vocábulo actualmente,
muito, e sua abreviatura proclítica
mui,
hoje em
dia só literária, continuará, como
até aqui, sem sinal especial que indique a
nasalização;
[18]
e
ruim,
que dialectalmente se profere
rũi,
será dissílabo, e não
monossílabo.
À vogal
â,
nasal, fixa-se a escrita
ã, final; às
demais vogais, e a
ã quando no
comêço ou interior do vocábulo
não se alterará a escrita já adoptada,
am,
an,
em,
en,
im,
in,
om,
on,
um,
un.
Em obras didácticas, porêm, é licito
indicá-las, com maior exactidão, por
ã,
ẽ,
ĩ,
õ,
ũ, e ao ditongo nasal
em por
ẽi,
quando a clareza da exposição o exija.
O sinal (¨) ou cimalhas, ápices, cuja
função em várias ortografias a maioria
da Comissão atribui ao acento grave (`), fica reservado para
denotar, em obras da espécie designada, o valor do ou
dialectal
(
öu,
ö,
[o:]) e o do
u igualmente
dialectal (
ü);
o
ë servirá para
representar em especial o
e fechado, antes de
palatal, que varia de valor, entre
ê e
â, dos estremos para o
centro de Portugal, como em
seja,
fecho,
selha,
senha, etc. São sinais
êstes que nenhuma aplicação tem na
escrita comum, na qual,
portanto, palavras com
exodo,
exito serão acentuadas
êxito,
êxodo,
e não
ëxito,
ëxodo, ou
ëisito,
ëisodo, como é a
sua pronunciação.
A acentuação gráfica tem como primeiro
fim acusar a sílaba tónica, considerando-se que o
til (~) vale
por acento tónico, se outro não existe marcado no
vocábulo ou forma; acusa ainda êsse acento a
tónica predominante, se
há mais de uma, e ainda, em monossílabos, que
estes não
são átonos. Esta acentuação
denomina-se
prosódica,
e compreende
não só oa dois casos indicados, mas igualmente
outros acidentes vocabulares, como a desunião de vogais que
geralmente formam ditongos.
Um bom sistema de acentuação deve ser tal que, ou
a sílaba predominante se assinale na escrita, ou
não, quem lê nenhuma
hesitação possa ter
sôbre qual seja essa sílaba. Com o sistema
proposto pela Comissão é satisfeito
êste preceito fundamental com tanta pontualidade, quanta
observamos na ortografia castelhana, ou na toscana, segundo o plano de
Petròcchi. O sinal do acento tónico
é o agudo nas vogais
a,
i,
u,
e e
o abertos, o circunflexo em
a,
e,
o fechados, e o til na vogal final
ã,
e nos ditongos nasais
ãe,
õe,
ão.
Na vogal nasal
ã, ou em
a antes de consoante nasal, adopta a
Comissão igualmente o acento circunflexo,
ânsia,
ânimo,
em
atenção a que êsse
a se profere fechado na maioria do
país. O
Vocabulário
marcou as
vogais nasais ou antes de nasal com o acento agudo, como sinal
[19]
geral
da sílaba predominante, e deve ter isso em
consideração quem o consultar.
Outra acentuação gráfica se
propõe, generalizando e fixando usos mais ou menos
estabelecidos, e esta pode denominar-se
distintiva.
Consiste no
emprêgo do circunflexo (^) sôbre todos os
ee
e
oo fechados de
monossílabos, ou de vocábulos
polissilábicos inteiros, isto
é, com a penúltima sílaba
predominante, quando outros existam em que tais vogais sejam abertas,
como já ficou indicado:
rêgo,
rego;
rôgo,
rogo.
Deve ter-se em atenção que, sendo toda a
acentuação vocabular, e sempre
fonética, quando um qualquer vocábulo, na sua
flexão, ou nos seus derivados,
muda de estrutura com relação à
acentuação que exigia, esta mantêm-se,
perde-se ou adquíre-se, conforme as novas
condições a que a forma, ou o derivado, ficam
sujeitos. Dêste modo, a palavra
cortês,
no
plural dispensa o acento,
corteses;
batéis, muda o agudo para
grave em
batèizinhos;
fugira,
será, na 2.ª
pessoa do plural,
fugíreis.
Regulou a Comissão tambêm o emprêgo do
hífen, o dos pontos de interrogação e
exclamação, o das letras maiúsculas, e
o do apóstrofo ('), que recomenda seja o mais parcimonioso
possível, pois o abuso que dêste sinal se tem
feito, onde é erróneo ou
desnecessário, nenhuma vantagem traz à
fácil leìtura, antes a
embaraça, e é uma desastrada
imitação da ortografia francesa, que muito
desfeia a escrita, complicando-a, bem como à
composição
tipográfica. A maioria das elisões de vogais
átonas, e a bem
dizer todas as crases de vogais consecutivas são evidentes,
e portanto desnecessário é indicá-las
na escrita
usual. No emtanto, fixa a Comissão a união em uma
só
dição para os seguintes pronomes e
advérbios acompanhados de
preposição, quando os primeiros não
rejam orações
de infinito:
dêle,
nele,
dela,
nela,
dêste,
neste,
desta,
dessa,
daquela,
nesta,
nessa,
naquela,
àquele,
àquela,
dum,
num,
daqui,
daí,
dali,
aonde,
donde, e para os plurais
dêsses pronomes, em harmonia com as formas já
empregadas
do(s),
da(s),
no(s),
na(s),
pelo(s),
pela(s),
(
em-no,
per-lo), onde a elisão se
não indicou jàmais; assim
tambêm,
doutro,
noutro.
Efectivamente, a indicação por
apóstrofo em formas tais como
d'um,
d'êle, para não
falar nos erros crassíssimos
n'um,
n'êle, é tam
inútil, como o seria escrevermos
vint'e um,
géner'humano,
vic'-almirante, em vez de
vinte e um,
género
humano,
vice-almirante, conquanto o
e
de
vinte
[20]
e o de
vice, assim como o
o
de
género se elidam na
pronunciação dessas dições.
Ninguêm ainda julgou necessário indicar-se por
apóstrofo a crase de
ao em
dezóito por
dezaoito; confrontem-se
dezasseis,
dezassete,
dezanove, e as formas toscanas
diciassette,
diciannove. As
formas escritas,
moderníssimas,
dezeseis,
dezesete,
dezenove são
erróneas e não correspondem por modo algum
à sua pronúncia, pois
ninguêm profere
dèzisseis,
dèzissete,
dèsinove, como o exigiria
esta formação, se nela entrasse a
conjunção
e, que se pronuncia
i. O povo diz, e muito bem, e dantes sempre assim
se escreveram,
dezasseis,
dezassete,
dezanove, única escrita
legitima, perfeitamente concorde com a toscana acima citada, e com a
pronúncia quer italiana, quer portuguesa.
Fora dos casos indicados, a preposição
de assim se escreverá, seja, ou
não, elidido o
e
na enunciação.
Aconselha a Comissão o emprêgo dos pontos de
interrogação e exclamação
invertidos (¿¡)
no comêço das orações dessa
espécie, quando sejam muito longas, como se faz na
ortografia espanhola; e com tanto maior empenho, quanto é
certo que, sem tal indicação
prévia, muitas vezes será errada a leitura, ou
ficará incerto o
sentido. As duas interrogações distintas―
Queres
vinho ou água?, e
¿Queres vinho, ou água?
não se
equivalem nem no sentido, nem na entoação.
O hífen ou linha divisória (-) utiliza-o e
preceitua-o a Comissão nos seguintes casos:
a) Separar de uma linha para a outra as sílabas de um
vocábulo, repetindo-se na linha imediata o sinal, se o
vocábulo já de si contêm a linha
divisória, por
ser composto.
b) Unir entre si os dois elementos de uma dição
composta, quando cada um dêles tem existência
independente em português, e conserva a sua
acentuação própria.
c) Unir às formas
hei,
hás,
há,
hão, do verbo
haver, a preposição
de,
enclítica:
hei-de,
hás-de,
há-de,
hão-de.
d) Separar nos vocábulos compostos com
bem,
mal o
m e o
l para evitar erros de
leitura; ex.:
bem-aventurado,
mal-aventurado.
São estes os principais fundamentos e preceitos da
projectada reforma ortográfica, pela Comissão
julgada
oportuna e de fácil execução, para que
de ora
em diante seja recomendada como obrigatória em
publicações oficiais e no ensino
público, e por isso a propõe. As
simplificações e a
regularização apontadas já tem
sido empregadas em
[21]
parte
em muitos livros e alguns periódicos, se bem que
quási sempre com menor coerência e rigor do que a
Comissão as preceitua, e sem formarem corpo de doutrina
explicada e motivada, como formam no Formulário e no
Prontuário ortográficos com que termina esta
exposição e que vão em seguimento. Se
exceptuarmos o
Vocabulário
e a
Ortografia Nacional
já mencionados, e cujo sistema só pequenas
alterações sofreu,
são êsse Formulário e êsse
Prontuário os primeiros trabalhos metódicos e
completos sôbre êste assunto.
A Comissão nem por um momento perdeu de vista que a
primacial vantagem de uma ortografia oficial é favorecer o
ensino fácil da leitura e da escrita, tanto quanto um idioma
secularmente literário o permite, tomando-se por base a
história do idioma pátrio, para que
êle se perpetue no futuro, como do passado até o
presente perdurou, sempre idêntico a si próprio,
apesar da sua
inevitável evolução.
FORMULÁRIO ORTOGRÁFICO
CONFORME O PLANO DE
REGULARIZAÇÃO E
SIMPLIFICAÇÃO DA ESCRITA PORTUGUESA
I. São proscritas de todas as palavras portuguesas, ou
aportuguesadas, as letras
k,
w,
y, as quais serão
respectivamente substituídas pelas seguintes:
k por
qu antes de
e,
i, por
c em qualquer outra
situação;
w
por
u, ou por
v, conforme
fôr a sua
pronúncia;
y por
i. Escreveremos, pois,
caleidoscópio,
quermes,
neutoniano,
Venceslau,
valsa,
tipo,
lira,
fisiologia, etc.
Excepções: 1.ª Poderão
usar-se essas
letras em vocábulos derivados de nomes próprios
estrangeiros, em que sejam legítimamente empregadas; ex.:
kantismo,
darwinismo,
byroniano (Kant,
Darwin, Byron), os
quais, porêm, será lícito escrever, em
harmonia com a
pronunciação,
cantismo,
daruìnismo,
baironiano. Confrontem-se
Copérnico, de
Kopernik,
Antuérpia, de
Antwerp,
(h)iate, de
yacht.
2.ª Continuam em uso os símbolos
W, para denotar o
Oeste, e
K como abreviatura de unidade
métrica, e tambêm na forma internacional
kilo...,
que todavia se poderá escrever
quilo...;
tanto mais, que o
k é um grosseiro
[22]
êrro nesta palavra, pois o correspondente termo grego se
escreve com
χ e
não
κ.
II. O abecedário empregado em português
ficará consistindo nas seguintes letras, e suas
combinações, e
portanto sómente com umas ou com outras se
escreverão todas as palavras portuguesas, ou aportuguesadas.
Essas letras e combinações são:
a b c ç ch d e f g h i j l lh m n nh o p qu r (rr)
s (ss) t u v x z.
III. É eliminada a letra
h do interior de todos os
vocábulos portugueses, com excepção do
seu
emprêgo, como sinal diacrítico, nas
combinações
ch,
lh,
nh, com os valores que as seguintes palavras
exemplificam, e únicamente para êles:
chave,
malha,
manha. Portanto, escrever-se
hão, sem
h,
inibir,
exortar, etc., e, semelhantemente,
saír,
coerente,
proìbir,
etc.
IV. É conservado o
h
inicial, quando a etimologia o justifique, como em
homem,
humano,
honra,
hoje; mas abolido onde
é erróneo, como em
hontem,
hir,
hombro, que se escreverão
ontem,
ir,
ombro.
Quando a uma qualquer palavra com
h
inicial etimológico se acrescentar prefixo, suprimir-se
há o
h; ex.:
desumano,
inumano,
desonra,
filarmónica,
desistória, etc.
V. É lícito escrever
h final, como sinal de
interjeição,
ah!
oh!; mas é proscrita esta
letra final em todos os mais vocábulos; ex.:
Sara,
Judá,
raja ou
rajá, etc.
VI. Em harmonia com a cláusula III é eliminado o
h dos grupos
rh,
th, ou outros quaisquer,
inexactamente denominados etimológicos, e portanto
escrever-se há
teatro,
retórica,
aderir,
aborrecer,
sirgo,
sorgo,
caridade,
cristão,
Cristo,
monarca,
técnica,
cloro, etc. O grupo
ch, com o valor de
k antes
de
e,
i, será
substituído por
qu; ex.:
monarquia,
arquitecto,
química,
querubim. O grupo
ph será expresso por
f;
ex.:
filosofia,
frase,
fenício,
farol,
física,
fisiologia,
ninfa,
profeta, etc. Assim tambêm
escreveremos
ditongo,
tísica,
apotegma, etc.
VII. Nenhuma consoante se duplicará no
interior ou fim de vocábulo, senão quando a
pronunciação assim o exija, o que só
acontece com
rr,
ss,
mm,
nn, como nas seguintes palavras:
carro,
cassa,
emmalar,
ennegrecer.
Nesta conformidade, escrever-se hão com letras singelas as
seguintes palavras, e outras que é hábito
escrever com letras dobradas:
abade,
acusar,
adição,
afecto,
sugerir,
agravo,
êle,
ela,
aludir,
chama,
pano,
anexo,
aparecer,
atribuir,
meter,
atitude, etc. As letras
r e
s dobram-se, se a pronúncia o exije,
quando a qualquer vocábulo se antepõe
[23]
prefixo terminado em vogal; ex.:
pressentir,
prorrogar,
ressuscitar:
cf.
arrasar, de
raso,
assegurar, de
seguro.
VIII. São suprimidas as consoantes mudas, quando
não influam no valor das vogais que as precedem; ex.:
autor,
restrito,
produto,
produção,
pronto,
presunção,
satisfação,
praticar,
tratar,
retratar,
sinal,
Madalena,
aumento,
Inácio,
Inês,
assunto,
assinar,
sono,
dano,
condenar, etc.
IX. São conservadas as consoantes, usualmente mudas, quando
facultativamente se profiram, ou quando influam no valor da vogal que
as precede; ex.:
contracção,
reacção,
direcção,
excepção,
adoptar,
adopção,
espectáculo,
carácter,
rectidão.
Neste caso os vocábulos aparentados, em que essas vogais
pertençam à sílaba predominante do
vocábulo, conservarão, por analogia, a consoante
muda; ex.;
contracto,
directo,
excepto,
adopto,
caracterizar,
recto,
acto, em razão de
activo,
acção, etc.
X. O emprêgo acertado das letras
ce,
ci, alternando com
(s)se,
(s)si, ou no interior do
vocábulo o de
ç, alternando com
ss,
depende da origem
dêsses vocábulos e do valor que as ditas letras
indicavam, quando a
pronunciação delas diferia, como ainda hoje
difere dialectalmente em várias regiões do norte
de Portugal. A
consulta ao
Vocabulário
é indispensável para decidir da escolha. Como
regra geral,
ce,
ci,
-ç- correspondem a
ce,
ci,
ti latinos, a
ce,
ci,
za,
zo,
zu do castelhano actual, a
ss arábicos, ou pertencem a
vocábulos de origem americana
indígena, transcritos pelos autores peninsulares.
Fica banido o
ç inicial,
que será substituído por
s nos poucos vocábulos em que
etimológicamente
figuraria; ex.:
sapato,
sarça, e não
çapato,
çarça, como
antes se escrevia, e ainda uma ou outra vez se escreve.
XI. É conservado o grupo inicial
sc, das seguintes palavras e seus derivados e
afins, em que o
s
é mudo:
scena,
sciência,
scetro,
scéptico,
scisma,
scisão,
sciático,
scintilar,
scelerado, e
algum outro menos
usual.
XII. O emprêgo de
ch ou de
x, os quais histórica e ainda
dialectalmente não eram nem são
idênticos no valor fonético, regula-se pela sua
origem, e a consulta ao
Vocabulário
torna-se
necessária. Deve ter-se em atenção que
ch corresponde a
cl,
fl,
pl,
t'l latinos, e a
ch francês nas palavras desta origem;
x
corresponde a
x e a
s latinos. Nos vocábulos de origem
arábica o
emprêgo de
x, e não de
ch,
é
de rigor; assim,
xeque, e
não
che(i)k.
XIII. A escrita dos ditongos orais é a seguinte:
ai,
éi,
[24]
ei,
ói,
oi,
ui,
au,
éu,
eu,
iu,
ou, como em
ensaio,
ensaiar,
batéis,
bateis (de
bater),
sóis (de
sol),
sois (verbo),
fui,
pau,
céu,
seu,
viu,
grou, e portanto
pai(s),
amai(s),
gerais,
réis,
rei(s),
faróis,
róis (nome plural e
verbo),
azuis, etc. Ficam abolidas as escritas
ae,
oe,
ue,
ao,
eo, para estes ditongos, quer em nomes, quer em
formas verbais.
XIV. A escrita dos ditongos nasais é:
ãe,
em
(
ens),
õe,
ão,
como em
mãe(s),
bem,
bens,
põe(s),
botões,
cães,
mão(s),
órfão(s),
cidadão(s).
Escrever-se hão com
am
final, em vez de
ão, as
formas verbais em que essa terminação seja
átona, como
louvam,
louvaram
(presente e
pretérito), diferente de
louvarão (futuro).
Os vocábulos terminados no ditongo
em (equivalente a
ẽi)
receberão o acento
circunflexo quando forem polissílabos com a
última sílaba predominante. Dêste
modo
porem, do verbo
pôr,
diferençar-se há de
porêm,
conjunção;
contêm, do verbo
conter,
de
contem, do verbo
contar; assim igualmente,
armazêm,
vintêm,
vintêns,
alguêm, mas
viagem,
origem.
(=
viágem,
orígem).
Os monossílabos com esta terminação
dispensam a acentuação gráfica, por
ser ociosa, e para que fiquem em harmonia com outros
monossílabos terminados em vogal, nasal; ex.:
bem,
bens,
tem,
tens; comparem-se
fim,
som,
um;
fins,
sons,
uns.
O ditongo
ũi
de
muito,
mui dispensa igualmente o til na escrita usual.
XV. A grafia das vogais nasais finais será a seguinte,
já consagrada:
ã(s),
im,
ins,
om,
ons,
um,
uns, como em
lã(s),
irmã(s),
órfã(s),
fim,
fins,
marfim,
marfins,
som,
sons,
jejum,
jejuns.
No interior dos vocábulos é a nasalidade da vogal
expressa por
m antes de
b,
p,
m, e por
n em qualquer outra
situação, o que é já uso
estabelecido, mas ao qual convêm não se fazerem
excepções; assim escreveremos
circunstância,
circunscrever,
conquanto, com
n, e não com
m.
XVI. É conservado ao
e
inicial átono o valor que tem de
i em
muitos vocábulos,
como
erguer,
herdeiro,
evitar,
elogio; sendo
porêm
substituído por
i nas
palavras
igual,
idade,
igreja e seus derivados, ortografia
anterior que se lhes restabelece. É semelhantemente
conservado o
e com o valor de
i
átono antes
de vogal, quando a analogia ou a etimologia o recomendem; ex.:
fealdade,
desfear, de
feio (cf.
desfiar, de
fio),
ideal,
meada,
reagente, etc. Restabelece-se
[25]
porêm a verdadeira ortografia de
pior,
lial,
rial (antes
peior,
leial,
reial), em que um
ei anterior se condensou em
i,
como aconteceu com
igreja (forma antiga
eigreja)
e como ainda hoje acontece
com o prefixo
eis-
(
ex-), que é usualmente
pronunciado
is. O último
exemplo citado,
rial, de
rei, fica assim
diferençado de
real, procedente do
latim
res.
O verbo
criar será
semelhantemente escrito com
i, pois a sua
conjugação é
crio,
crias, e não
creio,
creias, e portanto escreveremos tambêm
criador,
criatura,
criança, qualquer que seja a
acepção em que se tomem tais
palavras. O verbo
recrear, todavia,
escrever-se há com
e,
porque a sua conjugação é com
ei,
recreio,
recreias; devendo ter-se em
atenção que o
i intercalar, para evitar o hiato
recreo,
só tem cabimento
quando o
e do radical é
predominante, e conseguintemente escreveremos
passear,
cear,
desfear,
passeio,
ceio,
desfeio, e não
passeiar,
ceiar, etc.
Há considerável número de verbos, como
alumiar,
gloriar,
aviar, que se
conjugam
alumio,
glorio,
avio, sendo portanto a vogal final do seu radical
i e não
e. Todavia, por influência daqueles em
que essa vogal radical
é, pelo contrário,
e, que
átono se profere
i,
alguns verbos em
iar confundiram-se com
êsses, e é já hoje
impraticável a correcção. Os
principais dêstes verbos são os seguintes, e
convêm que não se traslade a outros a
irregularidade que se manifesta neles:
ansiar,
anseio;
negociar,
negoceio;
obsequiar,
obsequeio;
premiar,
premeio;
odiar,
odeio;
remediar,
remedeio. Em
outros, menos triviais,
é duvidoso o modo de os conjugar, como
licenciar,
presenciar,
sentenciar, que muitos preferem conjugar
licencio,
presencio,
sentencio,
conquanto as formas
licenceio,
presenceio,
sentenceio sejam muito mais usuais. É
claro que a irregularidade se não deve trasladar aos
substantivos correspondentes, e que portanto escreveremos
ánsia (e não
âncea ou
ância),
negócio,
obséquio,
ódio,
prémio,
remédio, e assim tambêm com i
os derivados,
odioso,
obsequioso, etc.
XVII. Na pronúncia do sul de Portugal o
s antes de consoante surda, e quando é
final, profere-se como
x atenuado, e sendo a consoante sonora, como
j,
igualmente atenuado. Se em tais condições
está
precedido de
e surdo, êste
e,
por
assimilação, palataliza-se e fica sendo igual a
i
na mesma
situação, de modo que os dois
vocábulos
pescar e
piscar
só
artificialmente se distinguem; assim tambêm a primeira
sílaba de
esteira confunde-se com a primeira
sílaba de
história, e tanto, que
antigamente se escrevia
[26]
estórea (com
ea,
para se evitar a leitura
estorja, pois nenhuma diferença
gráfica se fazia entre
i e
j). Para quem profira do mesmo modo
es
e
is, átonos, é
necessário recomendar que se regule pelas formas em que
e
ou
i sejam predominantes, a fim de acertar com a
devida escrita. No exemplo citado,
pescar procede
de
pesca, e portanto com
e
se
escreverá;
piscar, de
pisco, ortografar-se há com
i.
A confusão entre
es e
is mais freqùente, e que
dá margem a inúmeros erros de ortografia, ocorre
com os prefixos
des- e
dis-. É
usualíssimo ver-se escrito
destribuição, por exemplo.
Cumpre advertir que o valor dêstes dois prefixos, assim
confundidos na pronúncia meridional,
é diverso:
des-, é
privativo,
dis- indica
«repartição,
divisão». Escreveremos pois
destinto
com
e, de
destingir, de
tingir,
distinto com
i de
distinguir, e assim tambêm
dispersar,
discrição
(que
se não deve confundir com
descrição, de
descrever),
discórdia,
discorrer, etc.
XVIII. Sendo o
e átono,
antes de consoante palatal,
ch,
x,
j,
lh,
nh, por
assimilação igual a
i surdo, dá-se
freqùentemente a dúvida sobre a escrita com
e ou com
i, em sílabas átonas.
Convêm, do mesmo modo, recorrer
ás formas em que a vogal duvidosa seja predominante; assim,
lenheiro,
de
lenha, escrever-se há com
e,
linheiro, de
linho, com
i.
XIX. Por outra parte, no centro de Portugal o
e fechado antes das mencionadas consoantes
palatais
ch,
x,
j,
lh,
nh profere-se como
â, e esta
pronúncia vai-se difundindo cada vez mais no
país:
fecho,
cereja,
selha,
senha são pronunciados
fâxo,
cerâja,
sâlha,
sânha. Valendo o
a antes de consoante nasal,
m,
n,
nh por
â fechado, em geral, produz-se, pela
concorrência destas duas leis
fonéticas, onde elas predominam, a confusão entre
senha, «sinal», e
sanha,
«ira»,
entre
lenho,
«madeiro», e
lanho, «golpe».
Para não se deformar a língua pátria,
torna-se essencial a devida distinção
gráfica, ainda
quando se não observe na fala, e é
fácil acertar-se com a escrita, se
se atender à pronúncia dessa vogal, duvidosa
quando
tónica, em formas nas quais ela seja átona:
sanha, «ira»,
escreve-se com
a, porque dizemos
assanhar, e não
assenhar, ao passo que um verbo derivado de
senha
(
signa,
latino)
desenhar, se não profere
desanhar;
lanho, «golpe»,
tem um derivado
alanhar, que
não é
alenhar,
e conseguintemente deve escrever-se com
a.
[27]
XX. Continua o emprêgo tradicional de
o átono valendo por
u,
quer final, quer medial, quer
inicial, ou êle seja analógico, como em
formosura, de
formoso, de
forma,
porteiro, de
porta,
correr,
côrro,
corres, ou etimológico como em
monumento,
latim
monumentum,
governar, castelhano
gobernar,
latim popular
gobernare,
latim clássico
gŭbernare.
Na escrita será
indispensável atender-se á forma primitiva,
portuguesa ou latina, ou recorrer-se ao competente
Vocabulário,
pois os casos duvidosos, para os indoutos, são aos milhares.
Antes de vogal como em
mágoa,
nódoa, a
conjugação dos respectivos verbos,
magoar,
magôa,
ennodoar,
ennodôa, como em
soar,
sôa, indica a escrita
correcta. Com verbos como
aguar, cuja
conjugação é incerta, é
preferível escrevê-los com
u,
e assim
tambêm
água,
régua,
légua, visto que a razão da
escrita com
o era principalmente o evitar-se que
u
fosse lido como
v, quando nenhuma distinção
fixa e assente existia, para se
determinar quando as duas formas
u,
v eram consoantes ou vogais. Feita a
distinção, como há mais de um
século se faz, quer na escrita, quer na imprensa, deixaram
de ser
necessários êsse e outros expedientes
gráficos, como a
adjunção de
h a
u ou a
i, para indicar serem vogais, e
não consoantes, o que motivou as grafias
hiate,
huivar,
hia, para que
uivar,
iate,
ia se não lessem
vivar,
jate,
já. Alguns
hh e
alguns
oo teem essa origem a
explicá-los.
XXI. No centro de Portugal o digrama
ou, quando tónico, confunde-se na
pronunciação com
ô, fechado. A
diferença entre os dois símbolos,
ô,
ou, é de rigor que se mantenha,
não só porque, histórica e
tradicionalmente, êles sempre foram e continuam a ser
diferençados
na escrita, mas tambêm porque a
distinção de valor
se observa em grande parte do país, do Mondego para norte.
Outra razão se deve apontar ainda, e essa é que
ou átono ou conserva o valor que lhe
é próprio, ou,
popularmente, se profere
ò; ao passo
que
ô vale por
u nas sílabas
átonas; assim, por exemplo,
roubar, de
roubo, não altera o valor do
ou
do radical, o que
não acontece, por exemplo, com
rogar,
de
rôgo, em que
o vale por
u, se não é
predominante. Duas excepções, pelo menos, existem
modernamente:
apoquentar, de
pouco, e
aposentar, de
pouso, que antes eram
apouquentar,
apousentar. A
redução deve ter tido origem no sul, em que
ou
se
confunde com
ô.
Êste ditongo
ou alterna em
quási todos os vocábulos com o ditongo
oi,
ao qual muitos
dão a preferência, exceptuando
[28]
porêm certos vocábulos como
outro,
roubo, etc. A alternância
dá-se principalmente antes de
r,
s, como em
ouro,
cousa;
oiro,
coisa.
Quem prefira
oi a
ou assim escreverá, pois
qualquer das formas é lícita na maioria dos
vocábulos, como se disse. Nas formas verbais,
porêm, como a 3.ª pessoa do singular do
pretérito
louvou, não é
admitido o ditongo
oi por
ou,
nem tampouco em
coube,
soube,
trouxe, etc.
Advertir-se há que é errónea a forma
poude em vez de
pude,
1.ª
pessoa, e
pôde, 3.ª pessoa do
presente do verbo
poder, que tem origem diferente
(
potui,
potuit,
latinos) da que vemos em
coube,
soube (lat.
capui(t),
sapui(t)),
comum à
1.ª e
3.ª pessoas do mesmo tempo verbal dos verbos
caber e
saber. Um qualquer
indivíduo, originário das regiões em
que
ou
é diferente de
ô no valor, não
conjugará jamais assim erradamente o verbo
poder, nas duas formas citadas, nas quais
não há o ditongo
ou, como em
coube,
soube,
trouxe, mas sim
u e
ô fechado.
XXII. Acentuação
gráfica.
Como é uso corrente, marcam-se com o devido acento, agudo ou
circunflexo, os vocábulos terminados em
a,
e,
o tónicos,
seguidos, ou
não, de
s, e por analogia
os terminados em
em,
ens; ex.:
alvará(s),
louvará(s),
maré(s),
mercê(s),
portaló(s),
avô(s), e bem assim os
monossílabos, como
pá(s),
sé(s),
sê(s),
só(s);
vintêm,
vintêns,
contêm,
contêns; os monossílabos em
em,
ens, dispensam a
acentuação:
bem,
bens,
tem,
tens.
XXIII. O sinal denominado til (~) vale por acento tónico
quando não haja
outro acento gráfico a designar a
sílaba predominante do vocábulo; ex.:
cidadão(s),
escrivão,
escrivães,
nação,
nações,
mão(s),
mãe(s); mas,
ourégão(s),
rábão(s),
Estêvão,
Cristóvão,
etc.
XXIV. As palavras terminadas em
i,
u, vogal nasal ou ditongo, seguidos ou
não de
s, ou em outras consoantes, excepto na
terminação
em,
ens, entende-se terem como sílaba
predominante a última, não se
acentuando portanto gráficamente senão as
excepções a esta regra; ex.:
javali(s),
peru(s),
maçã(s),
atum,
atuns,
marau(s),
arrais,
esqueceu,
judeu(s),
painel,
farei(s),
mulher,
vencer,
timidez,
feliz,
arroz,
alcaçuz,
lioz,
alcatruz; mas,
quási,
Vénus,
órfã(s),
álbum,
amáveis,
fácil,
fáceis,
sável,
sáveis,
faríeis,
alcáçar,
carácter (plural
caracteres),
mártir,
sóror,
cônsul.
XXV. Os nomes terminados em
em,
ens, e as formas verbais em
am,
em, entende-se terem como sílaba
predominante
[29]
a penúltima, que se não assinala com
acento gráfico; ex.
louvam,
louvaram (cf.
louvarão, futuro),
porem,
contem (dos verbos
pôr,
contar), marcando-se o acento gráfico
quando a sílaba predominante seja a
última; ex.:
porêm,
contêm (de
conter),
armazêm,
armazêns,
Jerusalêm,
Belêm.
XXVI. Todos os vocábulos cuja sílaba predominante
seja a antepenúltima terão essa sílaba
marcada com o competente acento escrito; ex.:
sábado(s),
câmara(s),
cédula(s),
pêssego(s),
sêmola(s),
concêntrico(s),
título(s),
íntimo(s),
pródigo(s),
cómodo(s),
lôbrego(s),
lúgrube(s),
único(s);
área(s),
ária(s),
árduo(s),
mágoa(s),
contemporâneo(s),
Libânio,
ânuo,
proscénio(s),
gémeo(s),
ingénuo(s),
sêmea(s),
virgíneo(s),
insónia(s),
fúria(s),
facúndia(s),
ândito(s),
argênteo(s),
fímbria(s),
vergôntea(s),
núncio(s),
demónio(s),
António,
Antónia,
infortúnio,
farmacêutico, etc.
XXVII. O acento marcado nos esdrúxulos é
diferencial com relação aos vocábulos
que,
escritos com as mesmas letras, tenham por sílaba
predominante a
penúltima, ou a última; ex.:
fábrica, substantivo, e
fabrica, verbo;
réplica,
substantivo, e
replica, verbo:
índico, adjectivo, e
indico,
verbo;
história, substantivo, e
historia
(
rí), verbo;
telégrafo,
substantivo, e
telegrafo
(
grá), verbo, etc.
XXVIII. Quando um qualquer vocábulo que tenha por
sílaba predominante a penúltima, e cuja vogal
nessa sílaba seja
e ou
o abertos, fôr
homógrafo com outro em que êsse
e
ou
o seja fechado, marcar-se
hão êstes com o acento circunflexo. Assim se
diferençarão
rêgo, substantivo, e
rego,
verbo:
pêgo, ave, e
pego, abismo, ou forma do verbo
pegar;
rôgo,
substantivo, e
rogo, verbo;
sôbre,
preposição, e
sobre, verbo;
mêdo, susto, e
medo, nome étnico;
dêmos, presente do subjuntivo, e
demos,
pretérito (do verbo
dar).
XXIX. Diferençar-se hão pelo acento agudo os
seguintes vocábulos:
pára, verbo, de
para,
preposição;
pélo,
péla,
de
pêlo substantivo, e de
pelo,
pela (
per
lo,
per la,
per o,
per
a);
pólo, substantivo, de
polo (forma antiquada, em vez de
pelo);
e pelo circunflexo,
pêra, de
pera, forma antiga e
popular da
proposição
para;
quê, de
que proclítico, átono;
cômo,
verbo, de
como,
partícula. Pelo agudo se diferençará a
forma do pretérito,
louvámos, da do presente,
louvamos.
XXX. As
formas verbais
dêem,
lêem,
vêem,
crêem (de
dar,
ler,
ver,
crer) receberão o acento
circunflexo, ficando assim distintas de outras como
te(e)m,
ve(e)m, de
ter,
vir.
XXXI. Quando a segunda de duas vogais consecutivas
[30]
seja
i ou
u, que
não forme ditongo
com a vogal precedente, marcar-se há com o acento agudo, se
fôr tónica; ex.:
saí,
saída,
faísca,
saúde,
balaústre,
raízes,
baú(s). Se fôr
átona pode assinalar-se com o acento grave; ex.:
saìmento,
faìscar,
saùdar,
enraìzado,
abaùlado. É
licito dispensar-se o agudo se a consoante seguinte não
fôr
s; ex.:
ainda,
raiz,
sair, contanto que
não
inicie outra sílaba. Podem, portanto, escrever-se
Coimbra,
raiz,
sair, sem acento, mas exigem-no
saída,
saíra,
saúde,
raízes,
ataúde, etc.
XXXII. Os ditongos
éi,
ói,
éu, sempre finais
tónicos, receberão o acento agudo, que os
diferença de
ei,
oi,
eu, fechados; ex.:
painéis,
heróis,
chapéus; em
réis,
batéis,
papéis,
sóis êsse
acento distingue tais vocábulos dos seus
homógrafos
reis (de
rei),
bateis,
papeis (de
bater,
papar),
sois (do verbo
ser). Outros exemplos são
bóia,
jóia (cf.
joio, com
o fechado),
gibóia,
herói(s), etc.
XXXIII. Hífen.
Os vocábulos compostos cujos elementos conservam a aua
independência fonética unem-se por
hífen (-) e conservam igualmente a sua
acentuação; ex.:
água-pé,
pára-raios,
guarda-pó.
O
hífen repetir-se há na linha imediata, quando por
êle se faça a
separação silábica de linha para
linha; ex.:
pára-/-raios.
Quando um dos termos do vocábulo composto não
existe independente em português, na sua forma integral,
unem-se os dois elementos sem hífen; ex.:
clarabóia,
fidalgo. Outro tanto se
fará quando a noção do composto se
haja perdido, como em
solfa,
dezoito (
dez-a-oito).
XXXIV. O hífen será utilizado tambêm
nos seguintes casos:
a) Unir os pronomes pessoais enclíticos aos respectivos
verbos, de que são complemento; ex.:
louvá-lo,
devê-lo,
puni-lo,
dá-nos,
dou-vos,
falo-lhes, etc. A
acentuação do verbo mantêm-se, como se
não se lhes unissem
êsses complementos. São erros
inadmissíveis, mas muito
freqùentes,
louval-o,
devel-o,
punil-o, etc.
b) Os advérbios
mal,
bem, formando o primeiro elemento de um composto,
unem-se ao segundo elemento por hífen, quando sem
êle a soletração seria
errada; ex.:
bem-aventurança,
mal-logrado,
para que se
não leiam
be
maventurança,
ma logrado.
Este último,
todavia, pode ler-se tambêm
malogrado,
pois dizemos
malograr,
malôgro.
A palavra
aguardente
formará o seu plural como
aguardentes; se porém se preferir
separar os dois elementos,
água-ardente,
o plural
será
águas-ardentes.
[31]
XXXV. Há vocábulos que, sendo derivados, seguem a
analogia dos vocábulos compostos, com os seus elementos
unidos por hífen, em terem dois acentos tónicos
dos quais é predominante o segundo; são
êles os
aumentativos e deminutivos formados com o infixo
z,
e os advérbios derivados com o sufixo
-mente.
Se os
adjectivos ou substantivos de que se formam terminam em vogal com
acento agudo, muda-se êste em acento grave, ex.:
sòzinho,
cafèzinho,
màzona,
etc.
Esta mudança tem por causa o evitar-se que, escrevendo-se
mázona, por exemplo, se
entenda ser a primeira a sílaba predominante. Nos
advérbios, porêm, formados com o referido sufixo
-mente, que antes era um substantivo, a
acentuação com o agudo, ou o
circunflexo mantêm-se, por não poder dar-se a
confusão apontada:
fácilmente,
cortêsmente,
sómente.
XXXVI. Apóstrofo.
É quasi abolido êste sinal ortográfico,
absolutamente inútil para a leitura, e de
introdução
relativamente moderna. O seu emprêgo limitar-se há
a indicar,
principalmente na poesia, a supressão de uma letra, que
usualmente se escreve na prosa, como em
esp'rança,
mer'cer,
par'cer,
c'roa,
p'ra,
'star, etc. Pode, tambêm,
usar-se no interior das dições compostas, quando
nelas se
faça elisão do
e da
preposição
de,
como em
mãe-d'água.
XXXVII. Os pronomes complementos enclíticos de verbos
escrever-se hão como nos exemplos seguintes:
tenho-o,
tem-lo,
tem-no,
temo-lo,
tende-lo;
louvá-los,
devê-los,
uni-los;
louva-los,
deve-los,
une-los;
vê-mo,
vê-to,
vê-lho,
vê-no-lo,
dava-vo-lo,
vêem-se-lhe,
comprámo-la, sem se
indicar por apóstrofo a supressão de
e e de
s, que é de regra;
tem-lo, está por
tens-lo,
vê-mo, por
vê-me-o. O verbo
conserva a acentuação marcada que lhe competiria
sem
complementos, e assim é a sua
pronunciação.
XXXVIII. Reúnem-se em uma só
dição, sem apóstrofo ou
hífen, os seguintes pronomes, precedidos das
preposições
a,
de,
em,
por;
ao(s),
à(s),
do(s),
da(s),
àquele(s),
àquela(s),
dele(s),
dela(s),
dêste(s),
desta(s);
daquele(s),
daquela(s),
dêsse(s),
dessa(s);
naquele(s),
naquela(s),
neste(s),
nesta(s),
nesse(s),
nessa(s);
disto,
disso,
daquilo,
nisto,
nisso,
naquilo,
noutro.
Outro tanto acontece com os artigos
o(s),
a(s),
um,
uns,
uma(s), e os advérbios
aqui,
aí,
ali,
acolá,
alêm,
onde; ex.:
do(s),
da(s),
pelo(s),
pela(s),
no(s),
na(s),
aonde,
donde,
dali,
daí,
dali,
dacolá,
dalém, etc.
Quando porêm esses pronomes rejam
orações de infinito,
[32]
a preposição conservar-se há inteira e
separada; ex.:
por causa de êles não
quererem;
em razão de os não ter
visto.
As demais elisões, que no decurso da fala ou da leitura se
costumam fazer, não são indicadas na escrita;
não se escreverá pois:
d'idade,
d'entrada, mas sim
de idade,
de entrada; pelo
mesmo motivo por que se não
escreve
vint'e um, conquanto o
e de
vinte aí se
não profira. São elisões e crases que
é escusado representar na
escrita, e algumas das quais são facultativas, quer
individual, quer ocasionalmente.
XXXIX. Divisão
silábica.
A divisão de um vocábulo qualquer simples em
sílabas far-se há fonéticamente pela
soletração e não pela
separação dos seus elementos de
derivação,
composição ou formação,
contanto que a dição composta não
tenha os seus elementos apartados por hífen (-). Desta
maneira dividir-se há, por exemplo,
subscrever, como
subs cre ver, do mesmo modo por que a palavra
escrever se não divide como
e
scre ver; e
vezes,
pastora, como
vez
es,
pastor a, mas sim como
ve
zes,
pasto ra. Assim, tambêm,
di rec ção,
a dop
tar,
su
búr bios,
de sas tra
do,
de sar mar,
i ná bil,
bi sa vô,
pres tan te,
cir
cuns tân cia, etc., etc.
Para a segunda linha e para a soletração
pertencem à vogal que se lhes segue as consoantes que podem
começar palavra; assim teremos
co bra,
am plo, porque temos
bra ço,
pla ga;
ecli
pse (cf.
psicologia).
XL. Quando o
s dos prefixos
des-,
dis-, é seguido de consoante separa-se
dela; se depois se lhe segue vogal, pertence a esta, e com ela forma
sílaba; ex.:
des fa zer,
dis tri buir,
mas
de sen ga nar,
de
sen vol ver.
XLI. Duas consoantes iguais separam-se; ex.:
ar
rastar,
as sistir,
em
malar,
en nastrar.
XLII. As palavras compostas dividem-se pelos seus componentes; ex.:
porta-voz,
vice-almirante, repetindo-se na linha inferior o
hífen.
XLIII. Nos vocábulos formados com o prefixo
ex-, fica êste separado do segundo
elemento, ao dividir-se ou soletrar-se a palavra; ex.:
ex
ér ci
to,
ex ce der.
XLIV. São inseparáveis as letras dos seguintes
grupos de consoantes:
bl,
cl,
dl,
fl,
gl,
pl,
tl,
vl;
br,
cr,
dr,
fr,
gr,
pr,
tr,
vr;
ch,
lh,
nh;
sc,
ps.
Se, porêm, o
s se
lê separado do
c no
interior do vocábulo, separado se divide; ex.:
des
cer,
côns ci o,
pros cé nio; mas
en sce na ção.
XLV. São igualmente inseparáveis duas vogais
consecutivas,
[33]
formem ou não ditongo; ex.:
ai
po,
cau sa,
rai nha,
proe
mio,
goe la,
poei ra,
pro
nún cia,
voar,
voo,
á gua,
moi nho,
é gua,
i
guais,
con ti nua,
con tí nua,
fa mí
lia,
se ria,
sé ria,
rea lidade,
veí culo.
XLVI. O
u depois de
q ou
g é dêle
inseparável, quer seja mudo, quer se profira; ex.:
quin
ta,
guer ra;
fre qùente,
a
gùentar,
ar gùir.
PRONTUÁRIO ORTOGRÁFICO
Súmula das principais regras que se hão de
observar na escrita das palavras e formas vocabulares portuguesas:
1. O alfabeto português consta das seguintes vinte e quatro
letras, e de mais três, que sómente em
circunstâncias especiais se empregam e aqui vão
incluídas em
parêntese curvilíneo:
a b c ç d e f g h i j (k) l m n o p q[u] r s t u v (w) x (y)
z.
2. Alêm destas letras, há outros caracteres, que
ora são figurados por duas letras emparceiradas, ora por
sinais diacríticos, sobrepostos a várias dessas
letras.
Assim aumentado, o sistema de escrita portuguesa compõe-se
de 53 símbolos:
a, á, à, â, ã; b; c,
ç, ce (ci), ch; d; e, é, è,
ê; f; ge (gi), g, gu, gù; h; i, í,
ì; j; (k);
l, lh; m; n, nh; o, ó, ò, ô,
õ; p; qu, qù; r, rr, s, ss, sc; t;
u, ú, ù; v; (w); x; (y); z.
O valor dêstes caracteres, excluídas as letras
k,
w,
y, está exemplificado nas palavras
seguintes:
par,
pá,
àquela,
câda,
lã;
bobo;
cá;
praça,
cela,
cinta,
chá;
dado;
de,
sé,
prègar,
sê;
foz;
gema,
giz,
gágo,
guerra,
agùentar;
há;
li,
fígado,
faìscar;
já;
lá;
lhe;
mó;
nó,
lenha;
lado,
copa,
pó,
mòlhada,
avô,
põe;
que,
freqùente,
caro,
ré,
carro;
só,
passo,
scena,
casa;
tu;
fuga,
último,
saùdar;
véu;
xadrez,
exame,
sexo,
próximo,
texto;
zêlo.
3. Dêstes caracteres tem um único valor e
emprêgo os nove seguintes:
b,
d,
f,
j,
l,
p,
qu,
t,
v.
Os outros caracteres variam de valor.
4.
a: Designa o
a aberto quando
está na sílaba tónica principalmente,
e em sílaba átona se
está seguido de
l; ex.:
cabo,
faltou.
5. Fora da sílaba tónica denota em geral o
a surdo, como
boca,
parede,
camarote.
[34]
O
a surdo pode ser
tónico, se está antes de consoante nasal,
m,
n,
nh; ex.:
cama,
cana,
manha,
louvamos.
6.
á: Emprega-se com o
valor de
a aberto quando seja
necessário marcar
a
tónico, isto é: na última
sílaba, seguido ou não de
s;
na
penúltima, se a última não termina em
a(s),
e(s),
o(s),
m, e na antepenúltima;
ex.:
lá,
será(s),
fácil,
fáceis,
carácter,
sável,
prática. Emprega-se
tambêm para diferençar
pára de
para,
preposição, e na forma verbal do
pretérito, 1.ª pessoa do plural,
louvámos, para a diferençar
da do presente,
louvamos.
7.
à: Designa o
a aberto átono em
vocábulos que se escrevem com as mesmas letras, que outros
que tem
a surdo, e tambêm para denotar o acento
secundário
em derivados; ex.:
àbada (de
aba; cf.
abada,
«animal»),
pàzada,
desàbar.
8.
â: Indica o
a surdo tónico em
vocábulos esdrúxulos; ex.:
ânimo,
câmara; ou em inteiros
terminados em
i,
u, vogal nasal, ditongo ou consoante diferente de
s; ex.:
cânon,
âmbar,
etc.
9.
ã:
â nasal em fim de
vocábulo, seguido ou não de
s,
e nos ditongos
ãe,
ão; ex.:
lã(s),
mãe(s);
mão(s).
Se não há outro acento no vocábulo,
vale por acento tónico; ex.:
rabão, a par de
rábão(s).
O ditongo
ão
átono, final de formas verbais, escreve-se
am;
ex.:
louvam,
louvaram; cf.
louvarão, futuro.
Antes de
b,
p e
m, a vogal nasal
ã escreve-se
am, e antes de outra consoante,
an;
ex.:
campo,
lamber,
emmalar;
banco,
frango,
canto,
quando,
lança,
ânsia,
rancho,
laranja, etc.
10.
ce,
ci,
ça,
ço,
cu:
ç escreve-se antes de
a,
o,
u,
c sem cedilha, antes de
e,
i; ex.:
faça,
faço,
cabeçudo;
face,
fácil,
paço,
palácio,
palacete.
No interior dos vocábulos, corresponde a
ci,
ti latinos, e a
ss
arábicos, e nisto
se diferença do
s, o qual
corresponde a
s latino; ex.:
alçar (lat.
altiare),
razão (lat.
rationem),
faço (lat.
facio),
açafate,
açafrão,
refece,
açúcar
(arábicos);
paço, a par de
passo.
No comêço da palavra usa-se
s por
ç; ex.:
sapato.
Em fim de palavra escreve-se
z e
não
ç; ex.:
vez (lat.
uicem),
diferente de
vês (lat.
uides),
arroz (arábico).
11.
ch: Emprega-se como inicial e
medial, e nunca como final. Na pronunciação do
idioma culto, e
bem assim nos vernáculos meridionais, confunde-se no valor
há mais de dois séculos com o
x inicial, do qual se diferença
[35]
pela origem. Corresponde o
ch, em
geral, a
cl,
fl,
pl, latinos, e a
ch
francês
nas palavras desta proveniência; ex.:
chave
(lat.
clauem),
chama (lat.
flamma),
chuva (lat.
pluuia),
chapéu (fr.
chapeau). Corresponde a
ll e a
ch castelhanos.
O
ch com valor de
k é
substituído por
qu antes
de
e,
i, e por
c em qualquer outra
situação; ex.:
monarca,
monarquia,
querubim,
côro,
cloro,
corografia,
catecúmeno,
crisol.
12.
c: Esta letra emprega-se antes
de
a,
o,
u, consoante, ou como final, rara; ex.:
cá,
côr,
cume,
claro,
cravo,
facção,
Abimélec, etc.
13. Antes de
e,
i, é
substituída por
qu; ex.:
sequeiro,
ressequido, de
sêco. É mudo o
c actualmente em muitos
vocábulos em que antes se proferia, e conserva-se quando
a,
e,
o precedentes permanecem abertos, e
por analogia ainda mesmo que essas vogais sejam tónicas;
ex.:
secção,
acção,
activo,
acto;
espectáculo,
espectador; mas
autor,
junção,
junto,
sanção,
santo, etc.
14.
e: Designa em sílabas
átonas
e surdo; ex.:
se,
de,
me,
te,
lhe(s),
secar,
remediar,
lume,
úbere,
cadáveres, etc.
Vale por
i átono antes de
vogal, ou de consoante palatal; ex.:
fealdade,
teatro,
beato,
teor,
areeiro,
feíssimo,
conteúdo;
fechar,
telhal,
lenhador,
desejar. Cumpre recorrer à etimologia
do vocábulo, ou a uma forma
primitiva dêle, em que o
e seja
tónico, para assim o diferençar de
i;
fealdade, de
feio;
areeiro, de
areia;
fechar, de
fecho;
telhal, de
telha;
lenhador de
lenha;
desejar, de
desejo;
teatro,
beato,
teor,
conteúdo, do lat.
theatrum,
beatum,
tenere.
Tem tambêm
êsse valor de
i, como
inicial átona; ex.:
evitar,
erguer,
herói.
15.
e: vale por
e aberto, ou por
e fechado, sendo tónico; ex.:
neve,
certo,
der,
perda,
ver; e por
e aberto ou fechado, átono,
relveiro,
sável,
carácter,
cadáver,
secção,
abdómen.
16. Vale por
â no sul do
país, antes de consoante palatal e no ditongo
ei;
ex.:
igreja,
fecho,
telha,
senha,
lei.
Em várias regiões êste
e é proferido como
fechado em tal situação; ex.:
igrêja,
fêcho,
têlha,
sênha,
lêi.
17.
é: Denota o
e aberto tónico, quando
haja de marcar-se a sílaba predominante, isto é,
como final,
seguido ou não de
s, e nos
esdrúxulos; ex.:
maré(s),
cédula. Marca-se igualmente o acento
agudo no
e quando a sílaba predominante
é a penúltima e a palavra
não termina em
a(s),
e(s),
o(s),
am,
em, e bem assim nos ditongos
éi,
éu,
[36]
sempre tónicos; ex.:
éter,
Vénus,
fértil,
férteis;
céu,
escarcéu,
papéis.
Sem acento,
porêm, escreveremos
levam,
levem.
18.
è: Indica o
e aberto átono, quando se
torne necessário diferençar
homógrafos; ex.:
pègada, diferente de
pegada;
prègar, de
pregar.
19.
ê: Designa o
e fechado tónico, quando
seja de regra marcá-lo com acento; ex.:
mercê(s),
vê(s),
sêmea,
Zêzere,
pêssego,
concêntrico,
Estêvão, etc.
20. O
e nasal nunca termina
vocábulo no idioma comum, em que é
substituído pelo ditongo nasal
em,
ens (
[~e]i)s), o qual se
acentua quando é
tónico final de polissílabos; ex.:
vintêm,
vintêns;
contêm,
contêns;
parabêns.
21. No princípio e meio das palavras o
e nasal escreve-se com
em
antes de
b,
p,
m, e com
en, em qualquer outra
situação; inicial átono
profere-se como
im,
in; ex.:
membro,
tempo;
encher,
entrar,
encho,
entro;
entender,
entendo;
empregar,
emprêgo.
22.
g: O
g, para designar a consoante sonora
correspondente ao
c, escreve-se em qualquer
situação, excepto antes de
e,
i; ex.:
gago,
glaciário,
grade,
digno,
fragmento, e raras vezes como final,
Gog,
Magog. Suprime-se quando se não
profere; dêste modo, escreveremos:
assinar,
Inácio,
Inês,
aumento, etc.
Antes de
e,
i acrescenta-se-lhe
u
(
gu); ex.:
seguir,
guerra,
ligue,
aguilhoar.
Se êsse
u se profere
átono, marca-se com acento grave:
agùentar,
argùir,
argùente; se é
tónico, com o acento agudo,
argúi.
23.
ge,
gi: tem o mesmo valor que o
j e escreve-se em lugar dêste, quando a
etimologia ou a analogia o pedem; ex.:
gente,
lógica. Nos derivados de
primitivos em
ja,
jo,
ju permanece o
j antes de
e,
i; ex.:
laranja,
laranjeira;
loja,
lojista.
O
g etimológico muda-se
em
j antes de
a,
o,
u; ex.:
reger,
rejo,
reja;
fugir,
fujo,
fuja.
24.
h: É mudo quando
inicial, e escreve-se quando a etimologia do vocábulo o
justifica; ex.:
homem,
humano,
herdar, e portanto
ombro,
ontem, em que a etimologia o não
explica;
iate, e
não
hiate.
O
h medial desaparece, mesmo nos
vocábulos em que
[37]
êle como inicial figura; ex.:
desumano,
deserdar, e com maior razão em
inibir,
inábil,
filarmónica, em que daria causa a sua
presença a errada leitura; outros exemplos são
coìbir,
sair,
compreender,
desonra,
exibir, etc.
25. O
h, como sinal
diacrítico, junta-se a
c,
l e
n para designar os sons que as palavras seguintes
exemplificam:
chave,
frecha,
selha,
moinho.
26. O
h, depois de
t,
r ou
c com o valor de
k é proscrito; dêste modo
escreveremos
teatro,
retórica,
corografia. Suprimido é igualmente o
h final, como em
Sara,
raja, ou
rajá, e só se
admite em tal situação nas
interjeições, como
ah!
oh!, etc.
27.
i: Emprega-se como
átono, e como tónico; ex.:
finíssimo,
quási,
virar,
vira, etc.
28. Numa série de sílabas, cuja vogal seja sempre
i, e o vocábulo não seja
imperfeito ou condicional de
verbo, superlativo, ou deminutivo, sómente o
último
i conserva, em geral, na pronúncia
desafectada, o seu valor; os mais que o precedem proferem-se como
e
mudo, se a consoante seguinte não é palatal
(
x,
j,
lh,
nh,
s + consoante); ex.:
dividir,
dividia,
dividiria, que se pronunciam
devedir,
devedia,
devediria;
ministro, que se pronuncia
menistro;
ministério,
que se
pronuncia
menistério;
militar, que se pronuncia
melitar.
Para se evitarem
erros de ortografia, é preciso atender á
etimologia dos vocábulos, e,
quando possível, a uma forma em que o
i
seja
tónico, como em
divide.
29. Há dois prefixos de valor diferente, que cumpre
diversificar na escrita:
des- e
dis-. O primeiro é
negativo ou privativo, como em
desfazer,
destingir,
destinto; o segundo distributivo, como em
dispersar,
distinguir,
distinto,
disjungir,
discernimento,
distúrbio, etc.
30.
í: Designa o
i tónico, quando as
regras de acentuação gráfica exijam a
marcação; ex.:
frígido,
Vítor,
físsil,
difícil,
difíceis,
fugíeis,
tínheis,
fugiríamos,
fugíreis,
fugiríeis,
etc.
31. Com acento agudo se marca o
i
tónico que não forma ditongo com a vogal
anterior; ex.:
saída,
saí,
aí,
país,
países,
raízes.
Antes de
nh,
nd,
mb, pode dispensar-se o acento; ex.:
raínha,
aínda,
Coímbra, ou
rainha,
ainda,
Coimbra; pode tambêm dispensar-se antes
de consoante final que
não seja
s; ex.:
raiz,
sair; mas
raízes,
saíres, porque o
z e o
r pertencem a outra
sílaba.
32.
ì: Quando o
i que não forma ditongo
com a vogal
[38]
antecedente é átono, pode marcar-se com o acento
grave; ex.:
saìmento,
proìbir,
paìsagem.
33. O
i nasal escreve-se com
im antes de
b,
p,
m, ou quando final,
in em
qualquer outra
situação; ex.;
limbo,
limpar,
fim,
fins,
findar,
afinco,
linfa,
ninfa, etc.
34.
j: O
j escreve-se antes de
a,
o,
u,
e,
i, e antes destas duas últimas vogais,
quando a etimologia
não justifica o emprêgo de
g;
ex.:
já,
jóia,
júbilo;
veja,
vejo;
lojista,
laranjeira,
arranjar,
arranje;
Jerusalêm,
Jesus.
35.
m: Alêm do seu valor
como inicial, ex.:
mal,
tomar, etc., o
m designa as
vogais nasais
finais
im,
om,
um, por exemplo, em
marfim,
som,
jejum, e o ditongo nasal
em, como em
cecêm,
bem,
devem,
margem. O
m muda-se em
n ao
acrescentar-se
s; ex.:
marfins,
sons,
jejuns,
cecêns,
bens,
margens.
36.
m: Expressa com
a
(
am) o ditongo
ão átono de
formas verbais; ex.:
louvam,
louvaram.
37.
m: Denota qualquer vogal nasal
inicial ou medial antes de
b,
p,
m; ex.:
embora,
empada,
emmalar,
bambo,
êmbolo,
campo,
sempre,
limpo,
comprar,
sumptuoso.
38.
n: Alêm do seu valor
como inicial de sílaba, como em
nau,
neve,
nitro,
nove,
nuvem,
cana,
pena,
bonito,
nono,
canudo, etc., designa
as vogais
nasais, quando está seguido de consoante que não
seja
b,
p,
m, ou a vogal não
é final de vocábulo; ex.:
lança,
lenço,
cinto,
onça,
funcho,
fins,
sons,
jejuns. Com
e designa tambêm o ditongo
nasal
ẽi, quando se lhe segue
s final: ex.:
nuvens,
armazêns,
tens,
bens.
39.
nn: Emprega-se no prefixo
en, antes de
n do vocábulo a que se junta; ex.:
ennodoar,
de
nódoa,
ennastrar, de
nastro.
40.
nh: Denota únicamente
a nasal palatal que se observa em
manhã,
lenha,
linho,
vergonha,
pezunho; e conseguintemente escrever-se
há
inábil,
inumano,
inibir, sem
h.
41.
o: Esta letra tem os seguintes
valores.
Átona vale por
u; ex.:
lado,
dolo,
faro,
proteger,
comum,
fortuna. A escolha entre
o e
u, para expressar êste som, depende da
origem; assim escreve-se
formosura, de
formoso, de
forma;
portaria, de
porta;
monumento (do lat.
monumentum);
govêrno (do lat. pop.
[39]
gobernum,
lit.
gŭbernum);
rotunda (lat.
rotunda);
goraz
(lat.
uoracem);
etc.
42.
o: Expressa o
o aberto, como em
toca,
volta,
poste, etc., quando
é
tónico, e átono em certas
condições, como
adoptar,
nocturno, isto é, seguido
de
p ou
c na mesma sílaba, quer essas
consoantes se profiram, como em
optar,
cocção,
quer
sejam mudas.
43.
o: Designa
o fechado tónico, como em
bolo,
boca, ou átono como em
horrível,
cânon, e
o átono antes de
l, como em
voltar,
soldado.
44.
ó: Denota o
o aberto, quando a
acentuação gráfica é de
regra; ex.:
avó,
hipódromo,
órfão(s),
sós,
vós,
móvel,
móveis,
móbil,
cómodo, etc.
45.
ò: Serve para
designar
o aberto átono
em homógrafos, como
mòlhada,
diferente
de
molhada, e ainda para expressar o acento
secundário de palavras que tenham dois, como
pòzinho,
sòzinho, etc.
46.
ô; Designa o
o fechado tónico, quando
as regras de acentuação gráfica o
exijam; ex.:
avô(s),
côr (cf.
cor),
pôde (cf.
pode),
sôbre
(cf.
sobre),
fôrma (cf.
forma),
lôgro (cf.
logro),
lôbrego,
sôfrego.
47. Cumpre não confundir na escrita
o fechado com o ditongo
ou,
que se mantêm
distinto nos falares provinciais; assim
osso
substantivo escrever-se
há com
o, mas
ouço
verbo, com
ou.
48.
ou: Este ditongo tem por origem
au arábico, como em
açougue,
au latino, como em
touro,
oc,
ap,
al, latinos, como em
noute,
toutiço,
outeiro. Em geral alterna com o ditongo
oi,
sendo lícito,
em grande número de vocábulos, empregar-se um ou
o outro.
49.
õ: Esta letra usa-se
únicamente no ditongo nasal
õe,
como
põe(s),
lições. O
o nasal, fora dêste caso
único, é escrito com
om, se
é final ou está antes de
b,
p,
m, e com
on em qualquer
outra
condição; ex.:
som,
romper,
rombo,
emmolhar;
sons,
contar,
confiar,
conchegar,
esponja,
fonte,
bondade,
cônscio,
Ônfale, etc.
50.
p: Esta letra não se
duplica. Conserva-se o
p mudo depois das vogais
a,
e,
o átonas, quando essas
vogais permanecem abertas, como em
adopção,
recepção,
exceptuar. Conserva-se ainda o
p,
se essas
vogais são tónicas, em vocábulos
aparentados, como
excepto,
adopto. Depois de outra qualquer vogal suprime-se
o
p
etimológico, se não é proferido; ex.:
pronto,
assunto,
assunção,
cinto.
[40]
51. O
ph etimológico
é em todas as circunstâncias
substituído por
f; ex.:
física,
tifo,
filtro,
profeta.
52.
qu: A letra
q é sempre seguida de
u, o qual é marcado com acento grave (
ù)
antes de
e,
i, se é proferido; ex.:
quente,
quinta;
freqùência,
eqùestre,
eqùidade. Antes de
a,
o,
u, se o
u de
qu é mudo, substitui-se
êste grupo por
c; ex.:
catorze, de
quatordecim,
como
caderno, de
quaternum;
cota, de
quota,
como
licor, de
liquorem.
Se o
u
é proferido antes
de
a,
o,
u, conserva-se o grupo
qu,
sem acento no
u;
quatro,
aquoso.
53.
r,
rr: o
r forte escreve-se com
r simples quando é inicial de palavra,
ou de sílaba depois de
consoante; ex.:
rã,
ré,
rio,
rol,
rumo,
honra,
pilriteiro,
Israel, etc. Entre vogais duplica-se; ex.:
carrada,
carreta,
carril,
carro,
arrumar,
farrusca.
54. Quando a um vocábulo começado por
r se acrescenta um prefixo terminado em vogal,
dobra-se o
r, por ficar entre vogais, para se lhe manter o
valor de inicial; ex.:
arrasar, de
raso;
arrostar, de
rosto;
prorrogar,
derrogar, de
rogar;
corroer, de
roer.
55. O
r brando, que
sómente se manifesfa em fim de sílaba, ou entre
vogais, ou depois de consoante pertencente à mesma
sílaba, escreve-se com
r simples; ex.:
dar,
pôr,
ver,
vir,
virtude,
verdade,
vórtice,
louvar,
dever,
punir,
cravo,
fresco,
frigir,
crótalo,
frustrar;
cara,
fera,
lira,
amora,
parada,
sereno,
sarilho,
caroço,
caruma.
56. O
s surdo assim se escreve como
inicial de palavra, ou depois de consoante, se é inicial de
sílaba;
ex.:
saco,
sé,
sirga,
só,
sul,
ânsia,
falso,
farsa,
lapso,
psicologia,
absorver.
Inicial antes de
e,
i, e depois da consoante, nas mesmas
condições, alterna com
ce,
ci, e sómente a
etimologia dos vocábulos, ou um vocabulário,
ensinam a
verdadeira escrita. O
s corresponde a
s latino, o
c(e),
c(i) a
ti,
ci latinos, e a
ss arábicos; ex.:
sela,
silvo,
selha,
persistir,
canseira,
alicerce,
Alcácer, etc.
57. Entre vogais o
s surdo
duplica-se,
ss, e neste caso alterna com
ç
cedilhado,
e com
ce,
ci, nas mesmas
circunstâncias de proveniência dos
vocábulos; ex.:
assar,
assente,
assíduo,
posso,
assumir,
sossêgo,
passo, de
passum
(cf.
paço,
de
palatium),
etc.
58. O
s sonoro só se
manifesta entre vogais, usualmente, e nesta
posição alterna com
z, correspondendo porêm
[41]
sempre a
s latino;
ex.:
casa,
César,
mês(es),
residir,
formoso,
uso. Conquanto depois de consoante,
o
s é sonoro no prefixo
trans-
seguido de vogal,
como em
transeúnte,
transacção,
em
obséquio e seus
derivados, e num ou noutro vocábulo, precedido de consoante
sonora.
59. Há duas terminações de
substantivos que não devem confundir-se:
-eza,
do lat.
-itia, e
-esa, do lat.
-ensa; é esta que se escreve com
s, como em
defesa,
devesa,
presa,
despesa,
portuguesa, etc. Semelhantemente,
escreveremos
asa, do lat.
ansa,
brasa, em castelhano
brasa.
60. Quando a um radical, ou a um vocábulo,
começados por
s, se acrescenta um
prefixo
terminado em vogal, duplica-se o
s se
êle se
profere surdo, escreve-se simples, se é pronunciado sonoro;
ex:
assistir,
assombrar,
assumir,
ressurgir,
pressentir; mas
residir,
presente,
resumir,
resignação,
presunção,
etc.
61. O
s final de sílaba,
seja como for proferido, escreve-se com
s; ex.:
custa,
cesta,
resma,
abismo,
hóspede,
fosco,
balaústre,
lustre,
musgo.
62. O
s final de sílaba,
em monossílabos e em polissílabos que tenham como
predominante a última sílaba,
alterna com
z, correspondendo
porêm sempre a
s latino, e permanece
ainda quando, pela derivação ou
flexão do vocábulo, se lhe acrescenta uma
sílaba, de que fica
sendo inicial; ex.:
português,
portuguesa,
portugueses,
cortês,
corteses,
cortesia,
atrás,
vês (verbo),
vós,
nós (pronomes),
pus
(substantivo e verbo),
pôs (verbo),
pós (substantivo),
pusera,
puser,
pusesse, etc. Em um único
vocábulo arábico, rês, é o
s
final árabe representado por
s, como em castelhano (
res).
A consulta a vocabulário é
indispensável e muito favorece o acêrto na escrita
a comparação com as
correspondentes formas castelhanas.
63. O
s inicial surdo é
seguido de
c nos seguintes
vocábulos e seus derivados:
scena,
scetro,
scéptico,
scelerado,
sciente,
scisma,
scintila,
scisso,
scisão,
scissura,
scissíparo,
sciático,
e um ou outro
mais, pouco usados.
64.
t: o
t nunca se duplica, expressa
constantemente o mesmo som, e substitui em todos os casos o
th etimológico; ex.:
ter,
atitude,
meter,
teto;
teatro,
patológico,
simpatia,
etnografia, etc.
65.
u: Esta letra expressa sempre o
mesmo som, mais ou menos atenuado antes e depois de vogal, como
elemento
[42]
fraco dos ditongos; ex.:
tu,
pueril,
auto. Antes de vogal alterna, átono,
com
o nas mesmas
condições e só a analogia e a
etimologia doa vocábulos decidem da escrita correcta; ex.:
suar
(e
soar),
muar,
ruína, etc. Depois de consoantes
alterna igualmente com
o
átono; ex.:
mural de
muro,
a par de
moral do lat.
mores;
tunante, de
tuna,
tonante, lat.
tonantem.
66.
ú: Representa esta
letra acentuada o
u
tónico, quando as regras de acentuação
gráfica
o exigem; ex.:
único,
núncio,
saúde,
útil,
argúi.
67.
ù: O
u com acento grave indica
não fazer ditongo com a vogal anterior, sendo
átono; ex.:
saùdar. Designa tambêm o
u
proferido dos
grupos
qu,
gu; ex.:
argùir,
freqùente.
68.
x: Esta letra tem cinco valores
no idioma comum e literário; são os seguintes:
1.º Como inicial―
xadrez,
caixa.
2.º Como
ss―
auxílio,
próximo.
3.º Como
s―
mixto,
Félix.
4.º Como
cs;
cx―
fixo,
sexo;
córtex,
sílex.
5.º Como
(e)is―
exame,
êxito,
texto.
Nas palavras de origem arábica, e quando é
inicial, tem sempre o primeiro valor; ex.:
xabouco,
axorca,
xarope,
elixir;
Xerxes,
Xenofonte, etc.
69. Alêm desta multiplicidade de valores, alterna, com
relação ao primeiro, com o grupo
ch, o qual, como já se disse,
representa
cl,
fl,
pl latinos; assim, temos;
xá (rei) e
chá
(planta),
xeque (regedor) e
cheque (bilhete de banco),
buxo,
lat.
buxum
(planta), e
bucho, lat.
musc'lum
(estômago e
músculo).
A consulta ao
Vocabulário
é indispensável para o emprêgo de
qualquer dêstes dois símbolos, actualmente
equivalentes no valor.
70.
z: Como inicial, ou
depois de consoante, expressa o mesmo som que se ouve em
zêlo,
azeite,
zurzir. Os vocábulos formados com o
prefixo
trans-, e a
palavra
obséquio e seus
derivados, todavia, escrevem-se com
s, que representa
s latino,
como em
transir,
trânsito,
transacção.
71. O
z entre vogais
corresponde a
z, a
ti, e a
ce,
ci latinos, como em
baptisar,
razão,
fazer,
vazio, e nisto se
diferença do
s entre vogais que a
s latino corresponde. Os sufixos
-izar,
-izante, etc., escrevem-se sempre
com
z, como em
anarquizar,
judaìzante;
analisar, porêm, porque
provêm
[43]
de
análise, tem
s e não
z;
horizonte
z e não
s. Em palavras de origem arábica
é
z e não
s que se escreve; ex.:
azarola,
azeite,
azougue. O sufixo
-eza, como proveniente de
-itia
latino, tem
z; mas das
terminações
ansa,
ensa, latinas,
procedem os
vocábulos e as formas
asa,
defesa,
presa, etc.
O recurso ao
Vocabulário
é de necessidade para os casos duvidosos, como o
é para a hipótese
seguinte.
72. O
z final de palavra cuja
última sílaba seja a predominante, bem como o de
vários monossílabos, alterna com
s,
e tem o valor dêste
no idioma literário e comum.
Deve ter-se em atenção que o
s corresponde sempre a
s
latino, e o
z a
c latino e a
ss ou
zz arábicos; assim
teremos:
luz,
voz,
falaz,
feliz,
atroz,
vez,
capuz,
faz,
fêz, de origem latina,
algoz,
alcatraz,
albornoz, de origem
arábica; a única excepção
é
rês, como já se
disse.
73. Nos patronímicos as terminações
es,
s, conquanto provenientes de
ici
latino,
escrever-se hão com
s,
porque na sua maioria o sufixo português é
átono; ex.:
Rodrigues,
Nunes,
Gonçalves;
Dias;
Martins,
Miguéis; etc.
Semelhantemente, é substituído por
s um antigo
z final de sílaba, como em
mesquinho,
mesquita,
visconde, etc.
74.
k,
w,
y. Estas tres letras, proscritas do
abecedário português, sómente
são
admitidas na escrita de vocábulos estrangeiros, como
Kant,
Darwin,
Byron, e nos seus derivados portugueses, como
kantismo,
darwinismo, byroniano, que podem todavia ser
escritos
cantismo,
daruìnismo,
baironiano.
75. Escrever-se hão iniciais maiúsculas
em meio de períodos ou orações
gramaticais, nos seguintes casos:
a) Nomes próprios de pessoas ou lugares, ruas, etc.;
b) Nomes colectivos designando cargos, em
substituição das pessoas que os desempenham; ex.:
Estado,
Govêrno,
Companhia das
Águas,
Centro Comercial,
Patriarcado,
Cúria,
etc.;
c) Individualidades que
exercem importantes cargos:
Ministro da
Marinha,
Presidente,
Juiz, etc.;
d) Repartições públicas:
Direcção Geral das
Colónias,
Ministério da
Guerra,
etc.;
e) Nomes de astros, divindades:
Vénus,
Terra,
Sol, etc.;
f) Nomes dos meses, nas datas;
g) Títulos de livros, excepto as partículas
monossilábicas, que se escreverão com
minúsculas.
[44]
76. Hifen (-).
Êste sinal prende os vocábulos compostos, quando
os seus elementos, conservando a acentuação
própria, perdem em parte a sua
significação primordial;
ex.:
mãe-d'agua,
porta-bandeira,
água-forte,
franco-russo,
madre-pérola, etc.
77. O hífen une tambêm os pronomes
complementos átonos aos verbos de que dependem, quando
são
colocados depois dêstes; ex.:
dou-te,
dou-to,
dás-mo,
louvá-lo,
louva-lo,
louvam-no,
louva-o,
tenho-o,
tem-lo,
tem-no,
dávamovo-lo,
deram-se,
deu-se-lhes, etc.
78. Quando, em fim de linha, se parte um vocábulo inteiro,
parte-se igualmente o hífen, isto é,
repete-se na linha seguinte, se unia os elementos de uma
dição
composta; ex.:
porta-/-voz,
dou-/-to.
79. O hifen (-), com o nome de linha divisória,
divide, de uma para outra linha, as sílabas de uma palavra;
ex.:
pas-/ta,
do-/res,
ve-/zes,
parti-/cular,
di-/gnidade,
subs-/tância.
80. Pontos de
interrogação (?) e
exclamação (!).
À imitação da ortografia espanhola,
é conveniente assinalar com êstes pontos o
principio de uma
oração interrogativa ou exclamativa,
invertendo-os, todas as vezes que ela excede quatro ou cinco palavras,
para que essa oração seja logo devidamente
entoada; ex.:
¿Quando soubeste que a tua família
chegava de fora hoje?
81. Acentuação
gráfica.
A rigorosa acentuação gráfica das
palavras portuguesas deve satisfazer às
condições
seguintes:
1.ª Indicar, com a maior segurança para quem
lê,
quais são os vocábulos átonos e quais
os
tónicos, e nestes qual seja a sílaba
predominante, quando tenham mais de uma;
2.ª Diferençar entre si vocábulos que se
escrevem com as mesmas letras, mas divergem na pronúncia e
na
significação, ou função
gramatical,
82. Os
vocábulos portugueses são: de
uma sílaba, monossílabos; de duas,
dissílabos; de
mais de duas, polissílabos; ex.:
pá,
pára,
parada.
83. Há nos monossílabos e dissílabos
vocábulos tónicos,
dá,
pára, e
vocábulos átonos,
da,
para.
84. Os dissilabos tónicos podem ter como sílaba
predominante a primeira,
mares, ou a segunda,
marés; os
polissílabos podem ter como predominante a
última,
falará,
[45]
a penúltima,
falara, ou
antepenúltima,
faláramos.
Os
vocábulos cuja última silaba é a
predominante denominam-se agudos ou oxítonos; se a silaba
predominante é a penúltima, dizem-se graves,
inteiros, ou
paroxítonos; se a predominante é
antepenúltima, recebem o nome de esdrúxulos, ou
proparoxítonos.
85. Nenhum vocábulo português, de per si, pode ter
como sílaba predominante qualquer outra antes da
antepenúltima, conquanto haja dições
formadas por linguagens verbais acompanhadas de pronomes, a elas unidos
por hífen (-), em que a sílaba predominante, que
é a da
forma verbal, fica sendo a quarta ou a quinta a contar do fim; ex.:
dávamos-to,
dávamo-vo-lo. Tais
dições em nada modificam na escrita a
acentuação gráfica da
forma verbal, a qual permanece.
86. A sílaba tónica, quando se torna
necessário indicá-la na escrita, assinala-se com
o acento agudo (´) sôbre a vogal dominante dela, se
esta é
a,
e,
o abertos,
i ou
u; com o acento circunflexo (^), se é
a,
e,
o fechados. O til vale por acento
tónico, se outro não
está marcado no vocábulo; ex.:
fará,
maré,
portaló,
difícil,
útil;
câmara,
mercê,
avô,
ânsia,
indulgência,
brônzeo,
fímbria,
núncio;
varão,
maçã,
capitães;
órgão,
órfã;
munícipe.
87. Outro acento, o grave (`),
serve para designar, quando seja necessário ou
conveniente à correcta
pronunciação de um vocábulo ou forma
verbal, o valor
alfabético de qualquer das vogais
a,
e,
o,
i,
u, independentemente de serem
tónicas, e principalmente quando
o não são; ex.:
à,
pègada,
mòlhada,
faìscar,
saùdar.
88. Estabelecidas estas premissas, pode preceituar-se uma rigorosa
acentuação gráfica,
inteiramente sistemática, a qual, sem ser profusa ou ociosa,
deixe bem patentes os factos apontados, quer seja expressa,
quer omissa a sua notação.
89. Vocábulos não acentuados
gráficamente.
a) Monossílabos e dissílabos átonos:
o(s),
a(s),
lo(s),
la(s),
no(s),
na(s),
do(s),
da(s),
ao(s),
pelo(s),
pela(s),
polo(s),
pola(s),
me,
mo(s),
ma(s),
te,
to(s),
ta(s),
lhe(s),
nos,
no-lo(s),
no-la(s),
vo-lo(s),
vo-la(s),
lho(s),
lha(s);
se,
de,
por,
sem,
sob,
com,
mas,
que,
porque,
tam (abreviatura de
tanto),
sam (abreviatura de
santo), etc.
b) Monossílabos tónicos terminados em
em,
ens:
bem,
bens,
tem,
tens,
cem.
[46]
c) Formas verbais em
am,
em, com a penúltima
sílaba como predominante, e substantivos
dissilábicos e
polissilábicos em
em,
ens, nas mesmas
condições:
louvam,
louvaram,
louvem,
contem (do verbo
contar);
viagem,
viagens,
ferrugem,
ferrugens, etc.
d) Monossílabos e dissílabos tónicos,
e polissílabos, terminados em
i,
u, vogal nasal, ditongo, seguidos,
ou não, de
s, e os terminados em outra
qualquer consoante, todos êles oxítonos:
vi(s),
javali(s),
cru(s),
peru(s),
lã(s),
maçã(s),
sai(s),
arrais,
mau(s),
sarau(s);
som,
sons,
atum,
atuns;
mar,
der,
ser,
dor,
mal,
canal,
painel,
funil,
farol,
azul;
mão(s),
varão,
varões,
cruz,
Artur, etc.
e) Os dissílabos e polissílabos terminados
em
a(s),
e(s),
o(s), cuja penúltima
sílaba seja a predominante; ex.:
casa(s),
camada(s),
camarada(s),
trave(s),
parede(s), vicissitude(s),
desaire(s),
modo(s),
devoto(s),
lume(s), etc.
Estas espécies compreendem a maioria dos
vocábulos portugueses, incluindo-se tambêm nelas
as mais das formas verbais, como
louvo,
louva(s),
louve(s),
louvava(s),
louvara(s),
louvaria(s),
louvares,
louvarei(s).
90. Vocábulos acentuados
gráficamente,
cantar,
cantai, fazer, fazei, fazendo sentir,
sentirão, sentis, etc.
a) Monossílabos, dissílabos e
polissílabos terminados em
a(s),
e(s) e
o(s), como sílaba
predominante, isto é, agudos, oxítonos; ex.:
pá(s),
sé(s),
vê(s),
mês,
pó(s),
pôs,
fará(s),
maré(s),
mercê(s),
avó(s),
avô(s),
alvará(s),
jacaré(s),
português,
portaló(s), etc.
b) Dissílabos e polissílabos terminados em
em,
ens, cuja sílaba predominante seja a
última; ex.:
vintêm,
armazêm,
vintêns,
armazêns,
contêm,
contêns (do verbo
conter),
porêm,
Jerusalêm,
Belêm, etc.
c) Dissílabos e polissílabos
terminados em
i,
u, vogal nasal, ditongo, seguidos, ou
não, de
s, ou em outra qualquer consoante, quando a
sílaba
predominante seja a penúltima; ex:
quási,
Vénus,
órfã(s),
órfão(s),
louváveis,
louváreis,
fácil,
fáceis,
têxtil,
têxteis,
cônsul,
sável,
sáveis,
cadáver,
éter,
mártir,
sóror,
alcáçar,
Sófar,
açúcar,
gérmen,
líquen,
Félix,
córtex,
sílex, etc.
d) Os ditongos, sempre tónicos,
éi,
éu,
ói, com
e,
o abertos; ex.:
réis,
batéis
(cf.
reis,
bateis),
véu(s),
chapéu(s),
sóis
(cf.
sois, verbo),
róis,
herói(s),
jóia,
gibóia, etc.
e) O
a da
terminação
-ámos da 1.ª pessoa do
plural do pretérito, para a diferençar de igual
pessoa do
presente; ex.:
louvámos (cf.
louvamos=
louvâmos).
[47]
f) Os seguintes monossílabos e dissílabos
tónicos, para se diferençarem de outros
homógrafos
átonos:
quê,
porquê,
pôr
(cf.
por
preposição),
pára (cf.
para,
preposição);
pêra (cf.
pera,
p'ra,
preposição),
péla,
pélo,
pêlo (cf.
pelo,
pela, preposição
per
e artigo
lo,
la),
pólo (cf.
polo,
preposição
por e artigo
lo).
g) Todos os vocábulos esdrúxulos, isto
é, que tenham como sílaba predominante a
antepenúltima; ex.:
prática;
ânimo,
ânsia;
férvido,
género,
gémeo,
génio;
pêssego,
fêmea,
concêntrico,
tísico,
tirocínio,
fímbria;
próximo,
próprio,
antimónio;
lôbrego,
brônzeo;
úbere,
lúgubre,
único,
núncio;
cadáveres,
árvore(s),
multíplice(s),
múltiplo(s),
quádruplo(s), etc.
Assim tambêm as formas verbais esdrúxulas, tais
como
louvávamos,
louváramos,
louvaríamos,
devíamos,
devêramos,
deveríamos,
puníamos,
puníramos,
puniríamos,
louvássemos,
devêssemos,
puníssemos,
saíssemos,
fizéssemos, etc.
h) Marcam-se com o acento circunflexo os
ee e
oo fechados de vocábulos
paroxítonos terminados em
o(s),
e(s),
o(s)
fechados, quando haja outros,
escritos com as mesmas letras, em que essas vogais sejam abertas; ex.:
rêgo,
rôgo,
substantivos, a par
de
rego,
rogo, verbos;
dêmos, presente, a par de
demos,
pretérito,
sêde,
côrte,
côr,
mêdo, a par de
sede,
corte,
cor,
medo, com
e,
o abertos, etc.
i) Marcam-se com o acento agudo (´) o
i e o
u que não formem ditongo com a vogal
anterior; ex.:
país,
saída,
faísca,
Taígeto,
saúde,
balaústre,
baú, etc.
j) Se o
i ou
u, que não forma ditongo
com a vogal precedente, é átono, em vez do acento
agudo, usa-se o grave (`); ex.:
saìmento,
paìsagem,
saùdar,
abaùlado;
l) O acento grave designa tambêm o
u dos grupos
qu,
gu, se é
proferido; ex.:
conseqùência,
agùentar,
argùir. Muda-se em agudo se
êsse
u
é a vogal predominante,
argúi; cf.
argùi,
pretérito;
m) Emprega-se igualmente o acento grave para denotar que
a,
e,
o átonos são
abertos, quando haja homógrafos, em que eles sejam surdos;
ex.
à, e
a;
àquele(s),
àquela(s), e
aquele(s),
aquela(s);
àparte, substantivo, e
aparte, verbo;
prègar,
e
pregar, de
prego;
mòlhada, de
molho, e
molhada, de
molhar.
91. O acento distintivo (^), que assinala as vogais fechadas
ê,
ô, só tem
aplicação, tanto nos monossílabos,
como nos dissílabos ou polissílabos, se existe
homógrafo, isto é, vocábulo escrito
com as mesmas letras, de que
[48]
haja de diferençar-se; pode portanto omitir-se em
dor,
poço,
cera, por exemplo, porque
não existem, as palavras
dór,
céra, e
pósso, verbo,
já se diferença de
poço em escrever-se com
ss.
92. Semelhantemente, a
acentuação gráfica
omite-se logo que, pela flexão dos vocábulos,
deixam de
existir as condições que a determinaram.
Dêste
modo, se temos de acentuar graficamente
sêco,
sêca,
lôgro para os
diferençar das correspondentes formas verbais
seco,
seca,
logro, com
e,
o abertos,
a acentuação torna-se
inútil no
plural daqueles nomes masculinos,
secos,
logros, mas terá de
manter-se em
sêcas, em
razão da forma verbal
secas. Assim, tambêm, escreveremos
vaidoso(s),
vaidosa(s), sem sinal de acento no
o
da
penúltima sílaba, conquanto a
pronúncia seja
vaidôso,
vaidósos,
vaidósa(s). Outro
tanto sucederá com relação
ao
o aberto de vários
substantivos no plural, correspondente a
o fechado no singular; assim teremos
tejolo (
tejôlo),
tejolos
(
tejólos), sem acento
gráfico, mas
trôco,
trocos, e
troco, verbo.
As palavras
espôso,
espôsa(s),
terão acento marcado, em virtude de existirem as formas
verbáis
esposa,
esposa(s), com
o aberto; mas
o plural
esposos dispensa a
acentuação por não haver
homógrafo a diferençar.
Escreveremos
pôr, com acento
circunflexo, para o diferençar de
por,
preposição; porêm
dispor,
propor,
expor, etc., ortografam-se sem acento distintivo;
português,
cortês tem o acento
circunflexo no
e por este pertencer à
última sílaba, predominante; em
portugueses,
portuguesa(s),
corteses omite-se o acento por ser
desnecessário, visto os vocábulos
haverem passado de oxítonos a paroxítonos em
-esa(s),
-ese(s).
Por outra parte,
árvore(s) terá
acento marcado, por ser esdrúxulo,
arvore(s);
verbo, não o tem por ser paroxítono em
(e)s.
93. A conjugação de um imperfeito ou condicional
de verbo, como
louvaria,
deveria,
puniria,
louvava,
devia,
punia,
receberá acento
nas formas esdrúxulas
louvaríamos,
louvávamos,
deveríamos,
devíamos,
puniríamos, e nas
paroxítonas terminadas em ditongo,
louváveis,
louvaríeis,
devíeis,
deveríeis,
puníeis,
puniríeis; mas
saía tê-lo
há em todas as pessoas do imperfeito,
saía,
saías,
saía,
saíamos,
saíeis,
saíam,
porque o
i não forma ditongo com o
a que o precede.
94. Os nomes próprios acentuam-se graficamente como os nomes
comuns; assim escreveremos
Pôrto, como
pôrto, diferençado de
porto,
verbo;
Setúbal,
Pontével,
Pedrógão,
António,
Tomás,
Tomé,
Nazaré,
Belêm,
Águeda, etc.
[49]
É em virtude desta regra que teremos de acentuar a forma
verbal
lêmos, para
que se diference de
Lemos, na escrita, como se
diferença na pronúncia.
95. Os vocábulos compostos cujos elementos são
unidos por hífen (-) conservam os seus acentos
gráficos;
ex.:
mãe-d'agua,
pára-raios,
pesa-papéis.
O mesmo se observará com os advérbios formados
com o sufixo
-mente, dantes
independente, como substantivo que era, o que ainda se reconhece na
locução
de boa mente; ex.:
sómente,
cortêsmente,
rápidamente,
cristãmente.
96. Nos vocábulos derivados, aumentativos e deminutivos
formados com o infixo
z, o acento
agudo converte-se em acento grave, para que se evitem
leituras
erróneas; ex.:
má,
màzinha,
màzona;
avó,
avòzinha.
97. Na escrita comum parte desta acentuação
rigorosa e sistemática poderá, em algumas das
suas
minúcias, ser dispensada;
não porêm
em livros didácticos, como gramáticas,
dicionários, compêndios de qualquer natureza que
sejam, nos quais por todas as razões, mas principalmente
para que se não difundam e propaguem erros na
pronúncia, convêm que seja fielmente aplicada;
podendo mesmo ser ampliada com a marcação,
mediante o
acento circunflexo, de todos
os
ee e
oo fechados tónicos. Em qualquer caso,
todavia, cumpre que outros sistemas
arbitrários não substituam esta
acentuação
gráfica, metódica e harmónica,
prejudicando-a na sua coerência e
regularidade, a qual se baseia no exame escrupuloso dos factos.
*
A Comissão termina esta exposição
expressando o voto de que, se merecer aprovação o
sistema
proposto, êle se propague por meio de cartilhas e
gramáticas, que minuciosamente o exemplifiquem,
independentemente do
Vocabulário.
Direcção Geral da Instrução
Secundária, Superior e Especial, 23 de Agosto de 1911.
―Francisco
Adolfo
Coelho, Presidente.―
José Leite de
Vasconcelos,
Vogal.―
Cândido de Figueiredo, Vogal.
―Manuel
Borges
Grainha, Vogal.
―Aniceto
dos Reis
Gonçalves
Viana, Relator.―
José Joaquim Nunes,
Secretário.
(Diário do
Govêrno n.º 213, de 12 de
Setembro de
1911).
Lista de erros corrigidos
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